terça-feira, julho 04, 2006

«As competências dos novos Mestres vão, obviamente, ser idênticas aos actuais Licenciados»

"Os caminhos de Bolonha": opinião de Jorge Magalhães Mendes, Doutor em Engenharia.

Maio de 1998
A ideia da criação de um Espaço Europeu de Ensino Superior teve a sua génese num encontro de Maio de 1998, em Paris, entre os Ministros da Educação da Alemanha, França, Itália e Reino Unido.
Estes Ministros, por forma a materializarem um primeiro passo, assinaram em Paris a Declaração da Sorbonne onde se perspectivou já a constituição de um Espaço Europeu de Ensino Superior.

Bolonha 1999
No ano seguinte, nasceu a designação de “Bolonha”, Junho de 1999, quando os Ministros da Educação de 29 Estados Europeus, entre os quais Portugal, subscreveram a Declaração de Bolonha que contém, como objectivo claro, o estabelecimento, até 2010, do Espaço Europeu de Ensino Superior, coerente, compatível, competitivo e atractivo para estudantes europeus e de países terceiros.

Bergen 2005
Reunidos em Bergen em 2005 os Ministros do Ensino Superior dos países signatários da Declaração de Bolonha, aos quais se adicionaram a Arménia, Azerbeijão, Geórgia, Moldávia e Ucrânia, fixaram os objectivos e as prioridades até 2010.
[No Comunicado de Bergen] Reafirmando todos os princípios, objectivos e compromissos do Processo de Bolonha assumiram o compromisso de coordenarem políticas por forma a concluir o Processo de Bolonha até 2010, bem como apoiar os novos países aderentes a conseguirem os mesmos objectivos por forma a estabelecerem o European Higher Education Area (EHEA) até 2010.

Lisboa 2006
A 11 de Janeiro de 2006 o Governo de Portugal deu o primeiro passo ao publicar o Anteprojecto de Graus e Diplomas de Ensino Superior com vista a uma discussão pública. Este Anteprojecto viria a ser aprovado em 24 de Março de 2006 transformando-se no Decreto-Lei nº 74/2006, aprovando o Regime Jurídico dos graus e diplomas do Ensino Superior, em desenvolvimento do disposto nos artigos 13.º a 15.º da Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro (Lei de Bases do Sistema Educativo), bem como o disposto no n.º 4 do artigo 16.º da Lei n.º 37/2003, de 22 de Agosto (estabelece as Bases do Financiamento do Ensino Superior).
Este Decreto-Lei nº 74/2006 revoluciona o Ensino Superior em Portugal tal como o conhecemos desde há muito tempo:
1. Desaparece o grau de Bacharel;
2. O Grau de Licenciatura, com a designação de 1º ciclo, passa a ter uma duração de 3 anos (na maioria dos casos) ou 4 anos;
3. O grau de Mestre, com a designação de 2º ciclo, passa a ter uma duração de 2 anos (na maioria dos casos) ou 1,5 anos;
4. O grau de Mestre [agregado] com o de Licenciado tem uma duração média de 5 anos;
5. Os tempos de horas presenciais diminuem relativamente aos planos de curso actualmente em vigor;
6. Esta diminuição dos tempos de horas presenciais é supostamente “compensada” pelo novo paradigma de ensino-aprendizagem baseado entre outras técnicas no PBL (Aprendizagem Baseda em Problemas ou Projecto);
7. A aprendizagem é centrada no desenvolvimento das competências dos alunos.
Esta transformação do Ensino Superior em Portugal tem início no próximo ano lectivo de 2006/07 em muitas das nossas Universidades e Politécnicos. As estruturas curriculares e planos dos novos cursos foram feitos em tempo muito curto, com instabilidade do quadro legal (as novas normas técnicas foram publicadas em Diário da República em 31 de Março de 2006, último dia para entrega dos novos cursos na DGES [Direcção Geral do Ensino Superior] de acordo com o Decreto-Lei nº 74/2006...). Certamente alguns dos planos curriculares dos cursos terão de ser “retocados”.
Teria sido desejável que o quadro legal estivesse claro e publicado a tempo útil de ser possível reflectir sobre o impacto nas instituições. As mudanças de paradigmas nos métodos de ensino-aprendizagem são significativas para os professores e alunos. Todos têm de mudar de atitude face a este objectivo político europeu.
Mas se este percurso não é o melhor, mas o possível (...), o futuro a médio prazo pode ser preocupante. Vamos ter Licenciados no mercado [de trabalho] com três anos[,] com competências idênticas a Bachareis de três ou quatro anos... As competências dos novos Mestres vão, obviamente, ser idênticas aos actuais Licenciados... E o velho (ainda em vigor) Mestrado desaparece em definitivo. Podemos ainda adicionar o facto de os futuros Professores do Ensino Superior terem uma formação académica, em média, dois anos inferior aos actuais...
A proposta do espaço de Ensino Superior Europeu apresentada inicialmente pode ter o seu mérito. Mas foi realizada muito com base na postura dos alunos do Centro e Norte da Europa com hábitos de trabalho, desde o Ensino Secundário, muito diferentes dos alunos do Sul da Europa. Esta mudança pode ser, por isso, benéfica para os anglo-saxónicos mas um desastre para os latinos que vão ver na redução das horas presenciais mais tempo livre para actividades extra-escola. Se considerarmos ainda a resistência a aulas teóricas...

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