domingo, outubro 01, 2006

Bolonha obrigará Portugal a desinvestir no Superior

«Jornal de Notícias»
(23 de Novembro de 2004)

O processo de Bolonha vai implementar uma espécie de "quotas educativas", em que Portugal perderá [comparativamente] face aos países europeus tecnologicamente mais avançados. O alerta foi lançado, ontem, no Porto, pelo director do Centro de Investigação de Políticas do Ensino Superior (CIPES). Alberto Amaral revelou existir uma "agenda oculta" [do processo] de Bolonha, que [no Ensino Superior] reduz tudo a uma questão de competitividade económica do espaço europeu. Diminuir os custos com a mão-de-obra e os encargos do Estado com o Ensino Superior são os objectivos principais a atingir.
Não podia ter sido mais cáustico. Não fosse a conferência do ex-reitor da Universidade do Porto [UP], e aquilo que pretendia ser uma mera sessão solene de entrega de diplomas e prémios na Faculdade de Economia do Porto não se teria convertido no fim das ilusões da assistência sobre as reais finalidades da criação de um espaço europeu de Ensino Superior (processo de Bolonha).

Para Alberto Amaral, "o que está por trás [do processo] de Bolonha são os problemas dos salários europeus muito elevados, agravados pelo que resta do sistema do Estado Providência, os quais prejudicam a posição da Europa no novo sistema de competição económica global".

Traduzindo em miúdos, o ex-reitor [da UP] explicou que [o processo de] Bolonha vai permitir, por um lado, diminuir os custos de mão-de-obra, e por outro, fazer baixar os encargos públicos com o Ensino Superior, "de forma bem mais eficaz do que um simples aumento das propinas".

Alberto Amaral chamou a atenção da assistência para a substituição crescente do termo "emprego" por "empregabilidade". Ou seja, o primeiro ciclo de estudos, com relevância para o mercado de trabalho, será financiado pelo Estado. Contudo, serão os estudantes a pagar o ensino pós-graduado (2º ciclo) como forma de ele próprio zelar pela sua empregabilidade.

O director do CIPES revelou que o sistema de créditos [ECTS] não será uma moeda fiável para o reconhecimento de estudos e apenas irá criar "uma burocracia intolerável e asfixiante".

Para que não restassem dúvidas da veracidade das suas afirmações, Alberto Amaral mostrou a prova da sua visão realista: o rascunho do relatório de um dos grupos de trabalho criados pela Comissão Europeia para implementar o processo de Bolonha.

No documento [ver extractos abaixo, em «As provas de Alberto Amaral»], é proposto que países [como Portugal] longe daqueles que estão tecnologicamente mais avançados se concentrem "principalmente no Ensino Primário e Secundário (processo de imitação), enquanto que os países mais perto da fronteira [do avanço científico e tecnológico] devem investir prioritariamente no Ensino Superior (processo de inovação)".

No final, o ex-reitor [da UP] concluiu: "E, meus caros colegas, depois não se queixem por andarem a dormir ou por não terem sido avisados [das reais implicações da implementação do processo de Bolonha]".

As provas de Alberto Amaral

O rascunho do relatório [da Comissão Europeia] que serviu de base ao alerta lançado, ontem, por Alberto Amaral, na Faculdade de Economia do Porto, apresenta, entre outras, as seguintes recomendações, aqui [sumariamente] abreviadas:

- Não aumentar o financiamento público [para o Ensino Superior]; o acréscimo de financiamento, quando necessário, deve vir de fontes privadas;

- O aumento do financiamento privado poderá vir do aumento das propinas, de impostos sobre os detentores de um curso superior (graduate tax) ou de um sistema de empréstimos;

- O aumento do financiamento privado poderá ainda vir do estabelecimento de parcerias público-privado (como nos novos Hospitais [S.A.]) para o ensino e do encorajamento de actividades comerciais e de contratos de investigação entre instituições de Ensino Superior e do sector privado;

- Os salários dos professores e as suas carreiras devem passar a ser ligados à sua produtividade, nomeadamente em termos do sucesso dos alunos.

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