sexta-feira, outubro 06, 2006

Docentes do Ensino Superior preparam Greve

Os dois sindicatos mais representativos dos docentes do Ensino Superior estão a "acertar uma data" para um dia de Greve Nacional de professores das Universidades e Politécnicos, a realizar "no final deste mês". O crescente desemprego, a precariedade da profissão e a "falta de actuação" do Governo são os motivos que justificam esta aliança entre o Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup) e a Federação Nacional de Professores (Fenprof).
[...] Os problemas da classe, como a atribuição de bolsas de estudo a professores sem trabalho e a regulamentação do subsídio de desemprego a que estes docentes continuam a não ter direito.
[...] Assegurou o sindicalista do SNESup: «a menos que o Ministério actue de imediato, a greve é irreversível. O descontentamento é muito grande. Desta vez não nos vamos limitar a fazer umas "ondinhas".»
Notícia integral no Diário de Notícias.


«A corrosão da Universidade», artigo de opinião de Paulo Peixoto, presidente da Direcção do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup)

Ano após ano, as Universidades têm assistido a uma redução gradual do financiamento público. Na generalidade, o financiamento proveniente do Orçamento de Estado mal cobre as despesas anuais com salários de docentes. Este contexto, modelado pela reestruturação no âmbito do processo de Bolonha e pela avaliação internacional do sistema de Ensino Superior, configura uma situação de corrosão e de segmentação das instituições de Ensino Superior. Os contornos da racionalização do sistema, a intensificar no corrente ano lectivo, fundamentados no relatório que a OCDE [Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico] produzirá proximamente, evidenciarão ainda mais, como facilmente se adivinha, o processo de erosão e de fragmentação das instituições de Ensino Superior.

Por outro lado, o sector da ciência e da investigação científica tem vindo a beneficiar de aumentos no âmbito do Orçamento de Estado. Trata-se de um esforço louvável, dados os incipientes níveis de investimento em I&D [Investigação&Desenvolvimento] que se verificam em Portugal.

A reorientação do financiamento público nas áreas da Educação de nível Superior e da ciência e investigação científica marca uma inequívoca opção política. Esta, na sua essência, visa fragmentar o sistema de ensino e de investigação, polarizando-o. Num extremo, pontificará um diminuto número de instituições altamente financiadas e orientadas para actividades de I&D e de ensino pós-graduado. Noutro extremo, sobressairá um conjunto mais alargado de instituições vocacionado para a produção maciça de diplomas de primeiro ciclo.

O futuro do Ensino Superior joga-se entre instituições que formarão para o emprego qualificado e aquelas que se destinam a produzir diplomas baratos. É nesta perspectiva que o refreamento ministerial da oferta de segundos ciclos deve ser encarado. Esta segmentação corrói, em geral, as instituições de Ensino Superior, mas também, em particular, cada uma delas, no sentido em que as balcaniza em torno de interesses específicos, contraditórios e conflituosos.

Entre as diversas formas de erosão das instituições de Ensino Superior destaca-se a relativa ao emprego docente. Este, num cenário de crescente precarização e ameaça, assiste a uma dupla erosão. Os cortes orçamentais, por um lado, constituem uma forte pressão para a redução do emprego docente no Ensino Superior. As vítimas imediatas são os equiparados, nos Politécnicos, e os convidados, nas Universidades, que muitas vezes detêm as qualificações para estar na carreira e só não o estão porque as instituições precarizam deliberadamente os vínculos. A reorientação do financiamento, penalizando as instituições de ensino e favorecendo as instituições de I&D, afirma-se, por outro lado, como um factor adicional de corrosão.

O emprego científico de doutorados tem vindo a concretizar-se através de contratos de trabalho a termo resolutivo. No Ensino Superior Público, essa forma de precarização está proibida por Lei de 2004, registando-se no entanto tentativas ilegais de utilização de recibos verdes, e recorrendo-se largamente aos contratos administrativos de provimento (3/4 dos docentes do Politécnico). Contudo, a crescente tendência das unidades de investigação, na generalidade ligadas a Universidades, para promoverem cursos de formação do terceiro ciclo à base de serviço docente fornecido por doutorados contratados para fazer investigação configura um fenómeno prenunciador do futuro próximo.

Face a esta dupla corrosão do emprego docente, o SNESup tem vindo a reclamar medidas que permitam estancar despedimentos, diminuir os riscos de desemprego e promover a qualificação dos docentes mais ameaçados pelos factores de erosão do emprego docente. Uma dessas medidas passa pela celebração de contratos-programa, entre o MCTES [Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior] e as instituições de Ensino Superior, no âmbito de um Programa para a Qualificação de Docentes, anunciado pelo Ministro da Ciência, da Tecnologia e do Ensino Superior em 31 de Julho, na sequência de iniciativas conjuntas do SNESup e da Fenprof. Desse modo, para fazer face aos cortes orçamentais, e para envolver as instituições de Ensino Superior em dinâmicas positivas de captação de novos públicos e de qualificação da oferta formativa, pretende-se assegurar que as instituições possam manter o vínculo contratual com os docentes abrangidos pelo Programa de Qualificação durante o período de vigência do contrato-programa. A realização de contratos-programa que, em vez disso, financiassem os despedimentos, como veio noticiado na comunicação social em seguida a uma reunião do Ministro com o CRUP [Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas] e o CCISP [Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos], é inadmissível em todos os planos. Aliás neste momento as instituições não precisam de financiamento para despedir docentes, já que não têm sido obrigadas a pagar indemnizações nem a contribuir para o subsídio de desemprego, a que os docentes do Ensino Superior continuam a não ter acesso por falta de legislação que dê cumprimento às orientações do Tribunal Constitucional.


«Ensino Superior Público: Governo insiste em cortes orçamentais que ameaçam a qualidade e a eficácia do ensino e o emprego dos docentes», artigo de opinião de João Cunha Serra, coordenador do Departamento do Ensino Superior e da Investigação da Federação Nacional de Professores (Fenprof)

O Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior [MCTES] anunciou que todas as instituições públicas de Ensino Superior iriam sofrer um corte [no financiamento estatal] para 2007 de pelo menos 5% nos seus orçamentos de funcionamento, relativamente aos iniciais de 2006.

A FENPROF opõe-se a esta medida uma vez que ela se enquadra numa política de redução cega da despesa do Estado. O sector da Educação e, em particular, o do Ensino Superior, é estratégico para o desenvolvimento do país, em especial, para assegurar o aumento da competitividade da economia e a coesão social que lhe tem de estar associada.
O aumento das qualificações da população activa é um elemento fundamental que ficará seriamente prejudicado com a continuação do desinvestimento [público] no Ensino Superior.
Recorda-se que o país continua a despender por aluno, no Ensino Superior, menos de 2/3 do que a média da OCDE [Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico], em paridade de poder de compra (apenas 6 países, em 30, despendem menos [dinheiro] do que Portugal), sendo este o nível de ensino em que o investimento português é comparativamente mais baixo (dados do "Education at a Glance 2006").

Processo de Bolonha comprometido

Estes cortes orçamentais não se podem justificar, como em outros anos, com a redução do número de alunos colocados na 1ª fase do concurso nacional de acesso ao Ensino Superior Público, número que cresceu este ano 4%. Estas reduções orçamentais irão comprometer em larga medida os objectivos do Processo de Bolonha, designadamente a mudança de paradigma no que se refere ao acento tónico na aquisição de competências por parte dos alunos, bem como os objectivos de promoção do sucesso escolar e educativo.
A FENPROF encontra-se, como é natural, seriamente preocupada com os efeitos destes cortes orçamentais no recrudescimento dos despedimentos no Ensino Superior Público, onde há uma grande percentagem de docentes com contratos a prazo. A situação é pior no Politécnico onde cerca de 75% dos docentes são precários, estando a maioria dos quais contratos a um prazo máximo de 2 anos. As transferências do Orçamento do Estado pouco mais permitem do que pagar os salários, havendo até casos de escolas que já nem isso conseguem fazer. O MCTES prevê que as instituições possam ficar no próximo ano com orçamentos de financiamento 5% abaixo do necessário para o pagamento dos salários.

É necessário reforçar orçamentos

Perante este quadro, a FENPROF reclama do Governo e do MCTES que os orçamentos sejam de um modo geral reforçados. Reclama ainda que sejam postos de imediato em prática os contratos-programa a negociar com as instituições que se encontrem em maiores dificuldades para garantir o pagamento ao seu pessoal e o Programa para a Qualificação de Docentes do Ensino Superior - instrumentos que o Ministro prometeu concretizar em reunião conjunta com a FENPROF e com o SNESup, realizada em final de Julho.
A FENPROF está já a estudar os efeitos que estes cortes orçamentais terão nas escolas, e irá acompanhar todos os casos em que o pagamento dos salários não possa ser assegurado. Neste sentido a FENPROF está a solicitar aos docentes que lhe comuniquem todas as situações de previsão de despedimentos em resultado de dificuldades financeiras, de modo a poder intervir junto do MCTES exigindo uma solução que garanta que o emprego científico não seja reduzido, o que a acontecer iria em sentido oposto às promessas políticas do Ministro e do Governo quanto ao aumento do emprego científico.

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