O relatório de avaliação e recomendações da Rede Europeia para a Garantia de Qualidade no Ensino Superior (ENQA), foi apresentado na passada quarta-feira, em Lisboa, sob o olhar atento de Mariano Gago, ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. As conclusões não sopraram de feição ao Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior (CNAVES), que em 2007 vai mesmo ser substituído por uma nova agência.Em declarações ao MU [jornal «Mundo Universitário»], no rescaldo do evento, o líder da Federação Académica do Porto (FAP) – um dos únicos dois líderes das grandes estruturas estudantis portuguesas a marcar presença no local (além do presidente da Associação Académica da Universidade do Minho) – adiantou que o CNAVES «não foi propriamente entendido» ao longo dos seus dez anos de existência. «O que aconteceu é que os vários ministérios e sucessivos titulares das pastas optaram por não tomar em conta as recomendações e posições emitidas pelo conselho nacional», refere. «Nomeadamente em matéria das sanções propostas», continua Pedro Barrias (o relatório da ENQA sugere, por exemplo, que domina uma sensação de impunidade sobre as instituições que não apresentaram ao CNAVES a informação necessária para a sua avaliação e acreditação de cursos). Apesar de todos lhe reconhecerem o mérito de ter criado uma cultura de avaliação inexistente até 1994, o dirigente admite que «a questão da parcialidade é real [ver caixa relativa a pontos fracos do CNAVES]. Tenho conhecimento de que algumas avaliações externas eram corporativistas».
Parco envolvimento estudantil
Frederico Beja, representante dos estudantes do ensino superior público e concordatário no Conselho de Avaliação da Fundação das Universidades Portuguesas (CAFUP) – entidade que regulamenta o CNAVES – confirma a crítica à falta de autonomia deste órgão. «Num país pequeno, avaliarmo-nos a nós próprios levanta sempre conflitos de interesses», argumenta (nas recomendações, uma forma de o resolver seria a inclusão de mais peritos estrangeiros na agência). Outro ponto fraco é a «parca participação estudantil na avaliação». Porque quando as comissões internas visitavam as instituições e entrevistavam os alunos, «já o processo ia a meio». Frederico sugere a entrega de um parecer, nomeadamente da associação de estudantes, «logo, com a auto-avaliação da escola». O que julga já estar a ser considerado nas recomendações da ENQA relativamente à nova agência para a garantia de qualidade.
Nomeação gera controvérsia
Uma maior intervenção estudantil está acautelada no relatório, embora a forma sugerida de o fazer não seja consensual. O presidente da FAP mostrou-se insatisfeito com a escolha, pelo Governo, dos representantes estudantis a integrar o conselho consultivo da nova agência. Além da própria nomeação «fazer temer» sobre a neutralidade dos seleccionados, «a tradição no movimento associativo estudantil diz-nos que as associações de estudantes reconhecem legitimidade àqueles que elegem e não aos que são indicados pelo Executivo», explica. De qualquer maneira, tem esperança num maior envolvimento dos estudantes no futuro sistema de avaliação e acreditação. «Talvez possa eliminar alguma falta de consideração pelas nossas posições nessa área», avança. Contudo, o mais importante é que o ensino superior «dê o salto para corresponder àquelas que são as exigências a nível europeu».
Prognóstico optimista
O ministro da tutela também manifestou, em conferência de imprensa, expectativas elevadas face aos resultados. «Não queremos que a nova agência seja um mero repositório de conselhos que entram e saem sem deixar memória», adianta. Se o Governo considerasse que o sistema não precisava de melhorias, «nunca tinha encomendado este estudo à ENQA em Novembro de 2005».
Daqui a 3 anos no máximo – a ENQA sugere 5 – Mariano Gago espera que o ensino superior esteja todo avaliado e com cursos acreditados pela referida agência. Para já, garante que «a qualidade internacional como referência vai ser completamente acatada pelo Governo». E sugere que lhe agrada «a criação de competência técnica da própria agência» [as recomendações prevêem, no mínimo, 25 pessoas habilitadas]. A nível de encargos, estima-se que implique pouco mais de 2 milhões de euros por ano aos cofres do Estado, menos um milhão do que anualmente foi gasto, durante uma década, com a estrutura e os conselhos de avaliação do CNAVES. Segundo o titular da pasta, os sistemas mais onerosos não são os mais eficientes. «Verifica-se mesmo uma relação inversa», assegura.
1 comentário:
O MU [jornal «Mundo Universitário»] ainda nos fornece alguns outros textos de apoio:
"Pontos fortes do CNAVES" [introduziu o conceito e processo de auto-avaliação no sistema de ensino superior português (o que se verificou especialmente no sector privado); o processo de avaliação esteve em consonância com práticas de garantia de qualidade internacionais, e em particular com as normas europeias; as instituições privadas reconheceram que a sua inclusão no CNAVES as ajudou a melhorar a sua reputação e credibilidade no sistema a que pertencem. Isto segundo o relatório do painel de avaliação da ENQA – Quality Assurance of Higher Education in Portugal («An Assessment of the Existing System and Recommendations for a Future System»)],
"Pontos fracos do CNAVES" [independência limitada: o facto de ser “dominado” pelas instituições de ensino superior, aliado a algum desinteresse do Governo, contribuíram para que as suas avaliações fossem consideradas pouco críticas; ineficiência operacional: estrutura altamente descentralizada e dependente, para a sua coordenação, de reuniões colectivas, provou ser dispendiosa e poderá ter contribuído para a inconsistência das avaliações feitas; pessoal mal preparado poderá ser outra causa; falta de peritos estrangeiros: Portugal é um país pequeno e muitas vezes avaliadores e avaliados conhecem-se, o que pode comprometer a objectividade e independência do resultado final (o CNAVES também não tinha mecanismos que lhe permitissem verificar as capacidades e competências dos seus avaliadores); ausência de acompanhamento após a apresentação das avaliações: produto da passividade do Governo e do fraco dinamismo do próprio CNAVES, que se poderia ter dirigido às instituições para discutir os resultados obtidos ou apurar quais as acções destas face às recomendações formuladas; o processo de avaliação, as publicações e os encontros com o CNAVES forneceram menos provas do que o esperado sobre o encorajamento, comunicação e implementação de melhores práticas na elaboração dos currículos, ensino, aprendizagem e garantia da qualidade nas instituições. Isto segundo o relatório do painel de avaliação da ENQA – Quality Assurance of Higher Education in Portugal («An Assessment of the Existing System and Recommendations for a Future System»)]
e "E o critério flexibilidade?" [Ângela Dionísio, representante de «uma pequena instituição de ensino superior privada» – Escola Superior de Actividades Imobiliárias – está «preocupada com o aspecto do diagnóstico» e expô-lo na sessão de perguntas que se seguiu à apresentação pública do relatório. A pedido do MU, voltou a reformular a sua questão. Concorda com a referência a um ensino superior nacional de grande complexidade, mas defende que «essa diversidade deveria ser reflectida na fórmula e metodologias de avaliação utilizadas». Em que pé fica o «critério flexibilidade», mediante o qual não seria exigido a todas as instituições que alcançassem os níveis mínimos «à mesma velocidade e da mesma forma»? Christian Thune, coordenador do painel de avaliação da ENQA, foi claramente apanhado de surpresa e preferiu não entrar em detalhes. «A resposta veio no sentido da concordância», disse Ângela Dionísio. Contudo, pensa que a Rede Europeia terá passado essa “batata quente” à agência para a garantia da qualidade, cuja actuação futura, relativamente ao CNAVES, «só poderá ser melhor», sublinhou.].
Enviar um comentário