quinta-feira, novembro 23, 2006

«Falta de consequências fragilizou sistema [nacional] de avaliação do Ensino Superior português [ou seja, o CNAVES]», afirma a ENQA

Independência limitada, inconsistência dos relatórios, ineficiência da estrutura, são outras falhas apontadas por organismo europeu.
Ao longo de dez anos, o Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior (CNAVES) levou a cabo a apreciação de mais de 1500 cursos de instituições públicas e privadas e produziu outros tantos relatórios.

Um dos grandes problemas, nota a Rede Europeia para a Garantia da Qualidade no Ensino Superior - ENQA, é que muitas vezes não se tiraram consequências do processo e não houve um acompanhamento dos resultados da avaliação.

Tanto assim que nunca nenhum Governo fez uso das sanções previstas, como a redução ou suspensão do financiamento público, no caso de avaliações negativas sucessivas ou não cumprimento das recomendações por parte das instituições.

O mais intrigante, sublinham os peritos da ENQA incumbidos de fazer uma avaliação do trabalho do CNAVES e propor recomendações para a criação de um organismo substituto - a já anunciada Agência Nacional de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior -, é que nem sequer houve consequências para as instituições que "pura e simplesmente recusaram submeter os seus cursos a avaliação ".

"Ao contrário do Ministério [da Ciência e Ensino Superior], o CNAVES não tinha poderes para forçar essa participação. No entanto, informava o ministério regularmente", lê-se no relatório Garantia de Qualidade do Ensino Superior em Portugal, que é hoje apresentado no Centro Cultural de Belém, em Lisboa.

O estudo faz parte da avaliação internacional do sistema de ensino superior português encomendado no ano passado pelo ministro Mariano Gago a instituições como a Enqa ou a OCDE.

"Passividade dos governos"

E aponta várias responsabilidades para aquele que considera ser um dos principais pontos fracos do sistema de avaliação português. "A passividade dos governos explica em grande parte a falta de acompanhamento das avaliações. Tal como a falta de empenho por parte das instituições de ensino superior." Por outro lado, acrescenta, "as visitas às instituições para saber que medidas tinham sido tomadas em resposta aos relatórios de avaliação podiam ter sido conduzidas pelo próprio CNAVES".

Para os peritos da ENQA, o facto de os relatórios de avaliação externa dos cursos "serem muitas vezes escritos de forma vaga, sem conclusões e recomendações claras tornou ainda mais difícil a possibilidade de acompanhamento".

A título comparativo, a ENQA recorda o que se passou na Holanda, país que serviu de modelo ao sistema de avaliação concretizado pelo CNAVES. Aí, as avaliações eram seguidas por uma visita da Inspecção do Ensino Superior, a quem competia verificar se a instituição tinha delineado um plano de melhoria dos resultados, confirmando anos depois se tinha sido posto em prática. No caso português, conclui este organismo europeu, "o sistema de acompanhamento não respeita os critérios europeus".

"Familiaridade" entre avaliadores e avaliados

Outra das fragilidades do modelo português, aponta a ENQA, traduz-se na "limitada independência" do próprio organismo responsável pela avaliação. "A natureza representativa do CNAVES e dos seus conselhos de avaliação, com o predomínio de elementos das universidades públicas, compromete a independência do sistema", lê-se no relatório.

E um sistema que queira respeitar os parâmetros de exigência europeus tem de garantir a independência da agência de avaliação, em relação aos ministérios e às próprias instituições de ensino superior.

Sem pôr em causa a honestidade dos elementos que integraram as equipas de avaliação externa, a ENQA diz que os métodos de nomeação não respeitavam este princípio. E que o recurso a peritos nacionais, num país onde a comunidade académica é pequena, leva a que haja uma "considerável familiaridade entre avaliadores e avaliados".

Uma estrutura demasiado complexa, agravada pela falta de pessoal e formação dos avaliadores, levou também a problemas de "consistência nos processos de avaliação e nos relatórios finais preparados pelas várias equipas".

A ENQA ressalva que a experiência acumulada ao longo de dez anos deve ser tida em conta na constituição da nova agência de avaliação e realça como um dos pontos mais positivos a "cultura de auto-avaliação" que a actividade do CNAVES desencadeou em muitas instituições.

Leiam-se também as notícias do «Público»: "Elementos do CNAVES vão faltar à apresentação do relatório [da ENQA]" e "Recomendações da ENQA", também uma notícia do «DN»: "Certificação dos cursos superiores é ineficaz", outras duas notícias no «JN»: "Agência de acreditação e auditoria" e "Ensino Superior: Resultados de avaliação da nova agência em três anos" e uma última notícia do «Público»: "[Ordens dos] Engenheiros e Farmacêuticos aprovam agência para acreditar cursos superiores".

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