segunda-feira, novembro 02, 2009

Um caderno de encargos para o Ensino Superior

Foi com espírito de colaboração e de abertura que, ainda antes de se iniciar a actual legislatura, apontei um conjunto de objectivos que poderiam constituir o Programa do Governo na área do Ensino Superior.
Em primeiro lugar, a urgência de ordenar a oferta educativa. Existem cerca de 4000 cursos registados, sendo 1874 de licenciatura ou de mestrado integrado, com mais de 800 designações distintas. Esta diversidade não é uma mais-valia do sistema e dificulta a sua legibilidade.

Defendo que cursos com um conteúdo nuclear semelhante tenham a mesma designação e que cursos com um conteúdo nuclear diferente tenham designações diferentes, o que não acontece actualmente.

Um equilíbrio satisfatório poderia ser que a definição da designação dos cursos de 1º ciclo e de mestrado integrado fosse feita em sede de regulação, ficando os restantes ao critério das instituições.

Um segundo ponto passa pela racionalização da rede pública de instituições.

Quinze universidades, quinze politécnicos e quatro escolas não integradas, sem qualquer política de articulação entre elas ou programa de financiamento que a sustente, fazem do nosso sistema apenas um somatório de partes.

Venho propondo a criação de Regiões Académicas, agrupando ou articulando numa base regional as instituições. Apesar de esta ideia ser autorizada pelo actual RJIES, é necessário que o Governo promova, por sua própria iniciativa, a criação de mecanismos de coordenação.

Uma terceira acção é a de repensar toda a política de financiamento. É necessário fechar o actual ciclo de estrangulamento financeiro das Universidades que, nos últimos cinco exercícios, representou uma redução de 30% do esforço público de financiamento para funcionamento, medido em percentagem do PIB.

É necessário construir um novo modelo de financiamento numa base plurianual, quer em termos de funcionamento, aproximando-nos dos valores médios europeus, quer em termos de investimento, contratualizando Planos de Desenvolvimento em função dos objectivos pedagógicos e científicos.

É necessário ainda que o binómio Acção Social/Propinas seja analisado, tendo como certo que as portas do Ensino Superior actualmente se fecham, por razões económicas, a uma parte da população, que é necessário aumentar a taxa de escolaridade neste nível de ensino e que as propinas são das mais elevadas da Europa.

Em quarto lugar, é necessário clarificar o conceito de autonomia.
Com as recentes reformas da administração pública e o RJIES, temos hoje um quadro de funcionamento, em termos dos constrangimentos burocrático-administrativos, ainda mais limitativo do que há quatro anos. Entreabre-se a possibilidade de aproveitar a via das fundações públicas de direito privado, mas urge que se definam com clareza os mecanismos simplificados que esta via comporta.

O quinto e o sexto pontos apontam, respectivamente, para o retomar do processo de avaliação, corrigindo o erro que constituiu a interrupção do sistema de avaliação antes de pôr a funcionar uma alternativa, e para uma reaproximação entre as Universidades e o sistema científico – sabendo que nenhum país pode ambicionar a um sistema científico de qualidade sem assegurar igualmente o desenvolvimento das suas instituições universitárias.

Fernando Seabra Santos
Reitor da Universidade de Coimbra e presidente do CRUP

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