Cerca de um terço dos alunos de baixo rendimento deixaram a universidade entre 1995 e 2005.O aumento de propinas levou ao afastamento de alunos de famílias com baixos rendimentos.De 1995 a 2005, período em que foi introduzido o modelo de propinas nas universidades, o ensino superior ficou mais elitista. Foi esta a conclusão apresentada por Belmiro Cabrito na sua intervenção no FES 2009 [O financiamento do Ensino Superior], conferência dedicada ao financiamento superior organizada pela Universidade de Lisboa (UL).
Segundo os números apresentados pelo professor do Instituto de Educação da UL, a percentagem de alunos de rendimento baixo no ensino superior desceu um terço nesses dez anos, especificamente de 12,5% para 8,5%. Quase todos esses alunos foram ‘substituídos' por estudantes que vêem de famílias de rendimento médio, com a percentagem a subir de 69,9% para 73,8%. A percentagem de alunos de rendimento alto e médio alto manteve-se essencialmente igual, passando de 17,6% para 17,7%.
Belmiro Cabrito comparou estes números com os dados da população geral do censo de 2001, que dividiam o país em 9,9% de rendimento alto e médio alto, 52,1% de rendimento médio e 38% de rendimento baixo. "O grau de equidade da universidade portuguesa, é bastante baixo, remetendo para uma universidade ainda de elites. Em termos evolutivos, o elitismo da universidade portuguesa agravou-se", conclui o economista. "Esta tendência é notória e deve-se provavelmente à nova política de propinas. Em 1995 a média de pagamento de propinas era de 300 euros. Em 2005 passou a ser de 900 euros".
A primeira intervenção do dia coube a Luísa Cerdeira, que apresentou algumas das conclusões retiradas de um inquérito realizado em 2005 a uma amostra de alunos universitários. No que respeita às propinas, os estudantes responderam que, se estas aumentassem menos de 50%, os alunos tenderiam a ir trabalhar para pagar os estudos. Se o aumento fosse para mais de 50%, a tendência é para abandonar os estudos, sendo que essa tendência é maior ainda no ensino privado.
"Os alunos consideram que o ensino superior é um bem público que deve ser suportado pelo Estado e não concordam que as propinas sejam um factor de melhoria da qualidade do ensino", lembra a administradora da UL. A maioria também discorda da criação de um valor da propina ajustado em função do rendimento esperado após a obtenção da formação superior.
O papel do Estado
Outro dos valores comparados na sessão remeteu para a comparticipação do Estado no financiamento do ensino superior, mantendo-se a tendência que aponta para valores de 44% para o Estado e 56% para os estudantes. "Não houve mudanças significativas no sentido de uma maior participação do Estado na prestação de um serviço público. Estes valores tornam-se ainda mais significativos se compararmos o dinheiro que cada um destes grupos tem à partida", comentou Belmiro Cabrito.
Nicholas Barr, professor inglês que esteve presente no primeiro dia da conferência e é conhecido como um dos maiores defensores do sistema de propinas, utilizou a sessão de debate para defender esse modelo. "É importante fazermos uma distinção. Uma questão é dizermos que o ensino superior deve ser acessível aos mais desfavorecidos, o que deve acontecer. Outra bem diferente é dizer que o Estado o devia disponibilizar de graça", defendeu o professor dando o exemplo de um bem essencial como o da comida. "Querer facilitar a compra de comida para famílias mais pobres não quer dizer que ela deva ser disponibilizada de graça para todos".
Em resposta a esta teoria, Belmiro Cabrito lembrou que, embora a compreenda, "num país com 38% dos seus cidadãos com rendimento baixo, recuso-me a acreditar que só 8,5% não sejam ‘atrasados' em relação ao resto da população".