Os professores actuais serão prejudicados, fatalmente, em concurso, perante a manutenção do seu diploma como «licenciatura», quando se quiserem candidatar a outro posto em concorrência com os candidatos com «mestrado segundo o processo de Bolonha». Os professores actuais com mestrado, como tem sido conferido até agora, irão também sofrer a concorrência [desleal], pois não é verosímil que tenhamos «mestrados categoria A» e «mestrados categoria B».A maneira atabalhoada como o «processo de Bolonha» está a ser implementado [em Portugal], tem a ver com a pressa do Governo em despachar o assunto, por um lado, mas tem também a ver com uma atitude de consentimento das cúpulas sindicais, que estão absolutamente deliciadas com a situação... mas porquê?
Carlos Chagas, da FENEI [Federação Nacional do Ensino e Investigação], por exemplo, tem atrás de si um grupo de professores universitários das Universidades privadas, os quais estavam em sério risco de desemprego, visto que houve uma multiplicação descontrolada de licenciaturas, sem que houvesse de facto necessidade de tais cursos, ou de tantos «locais» conferindo os mesmos diplomas. Terão agora a «clientela forçada» de professores a meio da carreira, que vão à pressa tirar mestrados ou «equiparações a...» (uma venda de diploma disfarçada).
O conjunto dos «sindicalistas profissionais» da FNE [Federação Nacional dos Sindicatos da Educação] e da FENPROF [Federação Nacional de Professores] não têm que se preocupar com as suas próprias colocações, porque «assinaram o cargo para a vida inteira», ou seja, são sistematicamente candidatos e eleitos desde há decénios, alguns, e contam sê-lo até à [sua ida para a] reforma. Além disso, esperam assim ter o «prémio» de mais uns tostões, pelo facto de terem cedido vergonhosamente neste campo...
Esta enorme confusão está a fazer-se à custa das gerações futuras, principalmente... mas não só, pois como já vimos, os professores que já [o] são, ficarão discriminados perante os portadores de «mestrado [com processo de] Bolonha», se não conseguirem uma real equiparação (não apenas administrativa, mas com TÍTULO ACADÉMICO) da sua licenciatura a «mestre» (tenho quase a certeza de que estes não vão ficar TITULARES).
Do ponto de vista da qualidade da formação inicial é uma fraude. No Governo [de Pedro] Santana Lopes foi tornado difícil (porque não remunerado) o estágio para aceder à profissionalização e o Governo [de José] Sócrates manteve isso e praticamente acabou com esse formato de profissionalização, com actividade profissional nas escolas. A formação inicial «tradicional» ou seja, com um ano de estágio obrigatório para se ter a licenciatura pedagógica, habilitando ao ensino do Básico e/ou Secundário, tinha o mérito de se desenrolar quase toda num estabelecimento de ensino em que o estagiário tinha obrigações semelhantes aos outros colegas, porém apoiado por um orientador de estágio, pertencente ao quadro da escola.
Agora, os «mestres [com o processo] de Bolonha» vão sair com uma formação essencialmente TEÓRICA de 5 anos, e irão dar aulas sem qualquer preparação ou prática acompanhada, por professor experiente que esteja especificamente encarregue de acompanhá-lo.
Como se pode ver, além de criar situações difíceis por colocar injustamente em competição sectores dos docentes uns contra os outros (visto poderem ter formações semelhantes, com designação de grau académico diferente) está também a baixar o nível de qualificação inicial. Essa descida do nível é disfaçada com uma cosmética, a de chamar «mestres» às novas fornadas de candidatos à carreira de professor.
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Opinião de Manuel Baptista sobre a aplicação do Processo de Bolonha na carreira de professor, originalmente publicada n' «A Luta Social».
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