Um bolseiro do ensino superior recebe cerca de 170 euros mensais, menos de um terço do que é pago a um desempregado que tire um curso de Educação e Formação para Adultos. Uma disparidade que mostra as dificuldades por que passa quem não tem dinheiro e quer um curso superior.
A bolsa média mensal atribuída a um aluno do ensino superior, pouco mais de 170 euros, não chega a um terço do que recebe um desempregado que regresse à escola para completar o 6.º, 9.º ou 12.º ano e obter uma qualificação profissional, num curso de Educação e Formação para Adultos (EFA). Uma disparidade difícil de explicar quando as despesas dos primeiros estão longe de ser inferiores.
Segundo dados divulgados esta semana pela Direcção-Geral do Ensino Superior, dos períodos 1996/97 e 2006/07, as bolsas médias para estudantes do superior privado chegaram nesse último ano a 186,59 euros mensais, distribuídos por dez meses. Uma descida na ordem dos 90 euros em 10 anos, parcialmente compensada pelo facto de ter aumentado o número de alunos abrangidos. Relativamente às públicas, onde há muito mais beneficiários, o valor médio é inferior em cerca de 20 euros.
Comparativamente, ao entrar num curso EFA, a partir dos 18 anos, o desempregado, graças a apoios comunitários, tem assegurado durante 14 meses o equivalente ao salário mínimo (426 euros), acrescido de subsídios de refeição e transportes que elevam o montante para cerca de 500 euros. Se tiver filhos, recebe ainda apoios para a creche.
Não está em causa esta última oferta - calculada para garantir um mínimo de estabilidade financeira a que a aproveita - mas o que ela diz sobre as dificuldades de quem tenta tirar um curso superior sem recursos próprios ou familiares.
É que, segundo dados recolhidos por Luísa Cerdeira, uma administradora da Universidade de Lisboa que preparara uma tese de doutoramento sobre os custos da formação superior, um único ano de curso implica gastos de 6146 euros, entre despesas de educação e gerais, como alojamento, refeições e deslocações. "No sector universitário, um aluno gasta 5538 no público e 8735 euros no privado, no politécnico, respectivamente, 5057 euros e 7757", explica.
Pobres evitam empréstimos
Assim, no escalão mais alto, o aluno poderá aspirar às propinas pagas. Mas a maioria não chegará nem perto. "Esse número dos privados, que equivale a 1858 euros anuais, pode comparar-se com os 3023 euros que, em 2007, estes alunos pagavam de propinas", diz Luísa Cerdeira. "A OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico] recomenda que as bolsas para alunos carenciados cubram todas as despesas de educação e, se não todas, a maioria das outras. Em Portugal, é pouco mais de metade das propinas e nada do resto." A explicação passa por questões culturais: "Em Portugal, como noutros países do Sul da Europa, ainda se considera que se depois dos 18 anos o aluno prossegue os estudos é a família que tem de pagar." A consequência, defende, é que muitos "acabam por não o fazer".
E o sistema de empréstimos que o Ministério do Ensino Superior está a implementar, diz, não é a solução: "Há muitos estudos que mostram que as famílias mais pobres têm medo de contrair dívidas, e evitam-nas. O sistema é mais útil para ajudar famílias que passem por dificuldades temporárias, não permanentes."
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