terça-feira, fevereiro 06, 2007

«Do Minho ao Algarve: flexi-segurança [está a ser implementada] sem demora [nas Universidades]»

Do Minho ao Algarve, num servilismo inaudito e voluntarista às intenções do MCTES [Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior], crescem ímpetos de liberalização de despedimentos de docentes entre responsáveis pelos órgãos máximos de gestão das instituições de Ensino Superior.
Depois da Dinamarca e da Holanda, Portugal parece estar decisivamente encaminhado para apostar na flexi-segurança enquanto solução para reformar as políticas de emprego, as políticas sociais, as políticas laborais e para enfrentar o problema do desemprego.
O sistema de Ensino Superior é, no presente momento, um domínio privilegiado para se avaliar o contexto da eventual consolidação da flexi-segurança e dos seus efeitos em termos da concretização de um equilíbrio entre a flexibilização do mercado de trabalho e a segurança e a qualidade do emprego.
Em finais de Setembro, o ministro do Trabalho e da Solidariedade Social perguntava, na abertura do Seminário sobre «Flexi-segurança no contexto europeu»: "O que distingue as estratégias de flexi-segurança das estratégias de liberalização dos despedimentos, sobretudo quanto estas são acompanhadas de políticas de emprego e de protecção social?" A natureza retórica da pergunta leva-nos a concluir que nada distingue. Num sistema como o do Ensino Superior, onde, por desregulação pura e simples, cresce a liberalização dos despedimentos, a situação é tanto mais divergente e grave quanto nos confrontamos com a inexistência de políticas de emprego e, sobretudo, de protecção social em matéria de assistência em caso de desemprego docente.
Em Outubro, quando foram conhecidas as reduções dos montantes das transferências do Orçamento do Estado para as instituições de ensino superior (IES), para 2007, o presidente do Conselho de Reitores aventou imediatamente a passagem de docentes universitários a um quadro de excedentários e o presidente do Conselho dos Politécnicos desvalorizou eventuais despedimentos, argumentando que, sendo jovens e qualificados, os docentes não teriam dificuldade em encontrar emprego.
Entretanto, [da Universidade] do Minho ao Algarve, num servilismo inaudito e voluntarista às intenções do MCTES, crescem ímpetos de liberalização de despedimentos de docentes entre responsáveis pelos órgãos máximos de gestão das IES. Tão grave quanto os despedimentos, a precarização do emprego, muito para lá dos padrões específicos dos modelos de flexi-segurança, avoluma-se nas IES. Desde a subtracção compulsiva da exclusividade ao abaixamento de categoria, passando pela alteração unilateral de índices de remuneração, pela expansão dos recibos verdes, pela usurpação das competências dos Conselhos Científicos, pelo desejo em lhes retirar o poder de decisão em processos de nomeação definitiva submetendo essa decisão a critérios financeiros, pelas ameaças de despedimento maciço ou pelas advertências de renúncia de contrato, são inúmeros os exemplos, [da Universidade] do Minho ao Algarve, de precarização e de liberalização de despedimentos.
Paradoxalmente, esses impulsos precoces de flexi-segurança, muito flexi e sem nenhuma segurança, ocorrem sem terem suporte em mecanismos legais e, saliente-se, num contexto de um absoluto silêncio estratégico de uma tutela que tomou a decisão política de subfinanciar as IES. Mas ocorrem, sublinhe-se, na expectativa de promulgação de uma legislação prometida para 2007. Tão certa que justifica já uma gestão por antecipação e por conta do prometido. O servilismo empenhado que faz emergir estes impulsos de uma flexi-segurança à portuguesa, e que felizmente não está generalizado, participa da estratégia de depreciação do Ensino Superior em Portugal.
______________
Paulo Peixoto é presidente da direcção do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup), investigador no Centro de Estudos Sociais e professor na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra.
O presente artigo de opinião de Paulo Peixoto foi publicado na edição da passada quinta-feira (dia 1 de Fevereiro) do jornal «Público», anteriormente já havíamos transcrito um outro seu artigo de opinião: «A corrosão da Universidade».

Sem comentários: