domingo, dezembro 31, 2006

Geração desenrasca[-se] com apenas mil euros

Têm entre 20 e muitos e 30 e poucos anos. São licenciados, pós-graduados, mestres. Pensavam que o canudo era a garantia de uma vida desafogada. Mas enganaram-se redondamente.
Quando, aos 15 anos, Jorge Silva se imaginava com mais 15 [anos] via-se com uma criança pequena ao colo, a mulher ao lado e um cão deitado aos [seus] pés. Os quatro habitavam uma casa com jardim e garagem. O tempo passou, o Jorge concluiu uma licenciatura em Sociologia, fez uma pós-graduação, pensa no mestrado e, aos 31 anos, vive num minúsculo apartamento no bairro da Graça, em Lisboa.

Partilha a casa e a renda – 460 euros – com dois amigos. O Jorge trabalha há cinco anos numa editora, onde aufere um salário bruto aquém dos 700 euros. “Não é que seja infeliz, mas tinha imaginado uma vida diferente, com alguma estabilidade.” Se ganhasse um pouco mais, o sociólogo seria um ‘mileurista’, que é como chamam, na Espanha e na Alemanha, aos jovens de 20 e muitos ou 30 e poucos anos, com formação superior e conhecimento de línguas, cujo ordenado, no entanto, não excede mil euros.

Uma parte importante do salário usam-na para pagar a renda ou a prestação da casa, em regra no centro da cidade, onde há movimento. “Ganhar mil euros não era mau... eu sou mais um ‘setecentoseurista”, ri-se Jorge Silva, abrindo uma lata de cerveja com o cuidado de não estorvar o gato Tolstoi adormecido sobre os seus joelhos. “Na minha vida de sonho tenho um cão, mas o meu horário de trabalho e a dimensão do meu apartamento não permitem.” É mais fácil tratar do Tolstoi.

De acordo com um estudo da socióloga Natália Alves, a média das remunerações auferidas pelos licenciados da Universidade [Clássica] de Lisboa no primeiro emprego é de 709,90 euros. Mais de metade – 57,8 por cento – ganha entre 501 e 1.000 [euros].

O salário de Cláudia Ramos, de 27 anos, artista plástica e professora de Desenho, vai inteiro para pagar a renda do apartamento onde vive: 400 euros. E a luz, a água, alimentação, a roupa? “Organizo ateliers para crianças e, quando há oportunidade, faço ilustrações para livros.” Em situação de aperto, a mãe não lhe nega ajuda.

Cláudia vive na Baixa de Lisboa. Partilhava a casa com uma amiga, que, entretanto, partiu para o estrangeiro. “Foi muito complicado: de repente tive de pagar a renda sozinha. Pensei em alugar um quatro, mas o espaço faz-me falta para o meu trabalho. Preciso de um sítio onde possa desenhar descansada.”

O Jorge não tem automóvel e a Cláudia conduz um dois-cavalos muito velho. “As pessoas apontam o meu ‘chaço’ e riem-se. Por que é que, em vez de acharam piada, não se oferecem para pagarem o arranjo e a pintura?”, pergunta, muito bem humorada, a artista plástica, para quem a ligação doméstica à internet e TV por cabo não passam de “luxos incomportáveis”.

Na casa dela há muitos livros – nas estantes, em cima da mesinha, ao lado da cadeira. “Quando vivia com os meus pais comprava dois ou três [livros] todas as semanas. Isso acabou.” Cláudia não dispensa as idas ao cinema – desde que seja à segunda-feira, “porque é mais barato” – e não prescinde das viagens. Em 2005 passou uma semana em Roma. Quando regressou teve de apertar o cinto dois ou três furos acima do habitual. “Nunca almoçava fora. Nos dias em que o meu horário me obrigava a passar a hora da refeição na escola levava comida de casa.”

O Jorge já não pensa na casa com jardim, mas ainda não perdeu a esperança de ser pai. “Talvez, com um bocado de sorte, aos 40 ou aos 50 anos”, ironiza. Por que não agora? “Impossível. E não é só por causa do dinheiro que não tenho. Também o ritmo de trabalho e os horários são incompatíveis com a vida familiar.”

Inês Bastos, a viver no Bairro Alto, em Lisboa, é jornalista, a primeira licenciada da sua família. “Os meus pais sempre me incentivaram a que estudasse para ter uma vida sem privações.” Não se trata – repara – de ser ou não pobre num País onde dois milhões de pessoas vivem abaixo do limiar de pobreza. “O que está em causa é a frustração das expectativas. Existe um sentimento de falhanço, de inviabilidade económica.” Ela chega ao fim do mês com metade do salário do próximo já gasto. “Esta ideia de uma geração de mileuristas tranquiliza-me. Não sou a única que não consigo realizar os sonhos.”

O sociólogo Luís Capucha, investigador do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE) associa as dificuldades dos jovens adultos à democratização do Ensino Superior. “Há 20 anos a licenciatura assegurava o emprego. Hoje massificou-se.” Pelo caminho ficaram os projectos de bem-estar material, de estabilidade emocional e constituição de família dos 'mileuristas'. Ou dos que, em Portugal, nem a 'mileuristas' chegam.

“JOVENS SÃO OS NOVOS POBRES”

“O 'mileurista' é um jovem licenciado, com conhecimento de línguas, pós-graduações, mestrados, cursos (...) que não ganha mais de mil euros [de salário mensal]. Gasta mais de um terço do seu salário na renda porque gosta de viver no centro da cidade. Não consegue poupar dinheiro, não tem casa própria, não tem carro, não tem filhos, vive um dia de cada vez... às vezes é divertido, mas cansa (...)” - assim escreveu Carolina Alguacil na carta que, em Agosto do ano passado, enviou ao jornal espanhol «El País».

Carolina tem 27 anos, reside no centro de Barcelona, trabalha numa agência de publicidade e assume “soy 'mileurista'”, termo que inventou.

Que esta geração – ou, como se tem escrito, esta “nova classe social” – não é exclusiva da Espanha atestam-no investigadores como Louis Chauvel, professor de Ciência Política, que, em entrevista ao jornal francês «Nouvel Observateur» afirma: “Os novos pobres são os jovens.” Segundo Chauvel, os pobres do século XIX e do princípio do século XX – operários desqualificados, agricultores, idosos – pertencem a uma sociedade em vias de desaparecimento.

Carolina escreveu a carta ao «El País» depois de ter passado férias em Berlim, onde encontrou jovens adultos como ela: licenciados e mal pagos.

PROJECTO ADIADO

A maioria pôde estudar mais do que [a geração d]os pais e pensava que viveria melhor do que eles. Afinal, não foi bem assim. Uma breve radiografia dos 'mileuristas'.

EM CASA DOS PAIS

Dois terços dos jovens europeus vivem em casa dos pais. De acordo com o EuroBarómetro, as raparigas saem, em média, com 23 anos. Os rapazes abandonam o ‘ninho’ aos 26. Existem diferenças consideráveis entre o norte e o sul da Europa. No norte os jovens são independentes mais cedo.

EMPREGO E CANUDO

Em Março mais de 42 mil licenciados estavam desempregados, o que representa uma subida de 14,1% relativamente ao mesmo período de 2005. Dados do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) revelam que o desemprego apenas aumentou entre os licenciados.

HABILITAÇÕES A MAIS

Só metade dos licenciados da União Europeia [UE] com idades entre 25 e 34 anos executa funções de acordo com o grau de habilitações. Em países como a Espanha tal percentagem situa-se abaixo da média, ao contrário do que sucede em Portugal, Alemanha, Luxemburgo, Hungria, Polónia e Eslovénia.

TRABALHO TEMPORÁRIO

Ao contrário da maior parte dos países da UE, em Portugal o emprego temporário é uma realidade mais próxima das pessoas com habilitação superior, por comparação com os menos qualificados. Estes, bem como os detentores de formação média, gozam de maior segurança no emprego.

Educação lidera subida de preços desde 2002

Num contexto em que os preços em Portugal continuam a subir a um ritmo mais elevado que na «Zona Euro», entre Janeiro de 2002 e Novembro de 2006, só mesmo nas comunicações é que os preços recuaram. Do lado contrário estão a Educação, bebidas alcoólicas e tabaco, e transportes que foram, por esta ordem, os agrupamentos de produtos cuja evolução acumulada dos preços mais se fez sentir na carteira dos portugueses.
Os dados disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) mostram que, em termos acumulados e desde Janeiro de 2002, os preços dos serviços postais, de equipamento telefónico ou os serviços telefónicos, em conjunto, custam menos hoje do que custavam há quase cinco anos. Nos produtos relacionados com a Educação passou-se precisamente o contrário. Em quase cinco anos os preços de produtos relacionados com os vários tipos de Ensino aumentaram mais de 34 por cento. Em segundo lugar surge o agrupamento bebidas alcoólicas e tabaco com uma subida de 27,8 por cento. Na terceira linha de aumentos surgem os produtos ligados aos transportes: um conjunto vasto que vai desde a aquisição e reparação de veículos a todo o tipo de serviços de transporte de passageiros. No total, estes produtos levaram um aumento de 23,7 por cento.

Nov@s professor@s obrigad@s a ter mestrado

Os candidatos a professores deverão ter completado um curso de mestrado, feito à luz [do processo] de Bolonha, para poder dar aulas. O decreto-lei sobre o regime jurídico da habilitação profissional para a docência foi ontem aprovado em Conselho de Ministros.
O diploma determina que só se pode ser educador ou professor, se se tiver um mestrado em Ensino. As antigas formações vão ser substituídas por dois ciclos de ensino, a licenciatura e o mestrado, adequados ao processo de Bolonha, que prevê a harmonização do Ensino Superior europeu em 40 países. No caso dos futuros educadores do pré-escolar e professores dos 1º e 2º ciclos do ensino básico, é exigido que cumpram uma licenciatura em Educação Básica e um mestrado em Ensino. Com estas formações prevê-se que os mesmos candidatos possam leccionar todas as áreas dos 1º e 2º ciclos.
Quem queira ser professor do 3º ciclo e [Ensino] Secundário terá de ter habilitações profissionais para a docência de uma ou duas áreas disciplinares, também conseguidas através do mestrado. Por exemplo, se um aluno está interessado em ser professor de Matemática, deverá ter feito, durante a licenciatura, um determinado número de créditos nessa área disciplinar e depois aprofundar os seus conhecimentos com o mestrado.
Enquanto a licenciatura incide sobre as áreas científicas específicas de cada domínio de habilitação para a docência, e para os estudantes adquirirem o domínio de conteúdos científicos, humanísticos ou tecnológicos das disciplinas a leccionar, o mestrado prevê a prática pedagógica supervisionada, as didácticas específicas e a formação educacional geral, conferindo habilitação profissional.
Pretende-se ainda que as Universidades e os Politécnicos forneçam ferramentas que permitam aos futuros professores actualizar constantemente os seus conhecimentos. "Esta mudança demonstra o esforço de elevação do nível de qualificação do corpo docente, com vista a contribuir para a qualidade da sua preparação e para a valorização do seu estatuto socioprofissional", conclui o comunicado do Conselho de Ministros [cf. ponto 11].
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Sobre esta temática atente-se aos textos anteriores: "Nov@s docentes serão obrigad@s a tirar mestrado", "Para os candidatos a professores, o 1º ciclo com o Processo de Bolonha apenas lhes dá... Desemprego" e «As competências dos novos Mestres vão, obviamente, ser idênticas aos actuais Licenciados».

quinta-feira, dezembro 28, 2006

Balanço do Ensino Superior português no ano 2006, realizado pelo «Jornal de Notícias» (fracção 2/2)

Avaliações internacionais controversas

O ano ficou também marcado pelas avaliações internacionais realizadas pela OCDE (Organização para a Cooperação e Des envolvimento Económico) e pela ENQA (Rede Europeia para a Garantia da Qualidade no Ensino Superior), cujos relatórios foram apresentados recentemente.

A OCDE, responsável pela avaliação global do desempenho do sistema de ensino superior português, comparando-o com outros países, recomendou maior autonomia de funcionamento de universidades e politécnicos, o que deverá passar pelo financiamento público mas gestão privada. A Organização propôs também que professores e pessoal não docente percam o vínculo ao Estado, medidas que suscitaram contestação dos sindicatos, que consideram poder ficar em risco a liberdade académica.

Contudo, o relatório mais polémico foi a efectuada pela ENQA, responsável pela avaliação da qualidade e acreditação do sistema de ensino superior. O organizmo concluiu ter havido falta de independência e de eficácia do órgão que nos últimos dez anos avaliou o ensino superior, o Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior (CNAVES). Aliás, este organismo vai ser extinto até final do ano, para dar lugar a uma agência nacional de garantia de qualidade, a única a ser acreditada pela Agência Europeia. Este processo não foi nada pacífico, tendo inclusivamente levado em Julho à demissão do presidente do CNAVES, Adriano Moreira, que acusou o Ministério de não ter transferido as verbas previstas para prosseguir a avaliação nacional, levando assim à paralisação do sistema.

Balanço do Ensino Superior português no ano 2006, realizado pelo «Jornal de Notícias» (fracção 1/2)

Universidades preparam-se para a Europa com cortes orçamentais: MUDANÇAS QUE GERAM MAIS POLÉMICA
Além do anúncio dos cortes orçamentais para as Universidades previstos para 2007, a adaptação de quase metade das licenciaturas às regras europeias definidas no Processo de Bolonha e a assinatura de um acordo de parceira entre o Governo português e o MIT marcaram o Ensino Superior neste ano.
Em Março, muitas Universidades públicas apresentaram propostas para adaptar os cursos ao Processo de Bolonha, um compromisso assumido em 1999 pelos países europeus que visa harmonizar os graus e diplomas atribuídos, de modo a criar um "espaço europeu do Ensino Superior" que facilite a mobilidade e a empregabilidade dos estudantes.

O ano lectivo 2006/2007 arrancou com 42% das licenciaturas no ensino superior público adaptadas às regras de Bolonha, um modelo que acabou com os bacharelatos e passou a estar assente em apenas três ciclos licenciatura (com duração de três anos), mestrado (dois anos) e doutoramento (com um mínimo de três anos).

Já este mês, o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Mariano Gago, de acordo com a Lusa, afirmou que o número de licenciaturas do ensino superior público e privado adaptadas ao Processo de Bolonha vai aproximar-se dos 90% no próximo ano lectivo, adiantando-se ao prazo de conclusão do processo nos 45 países aderentes, que termina apenas em 2010.

Cortes polémicos

Polémico foi o corte no Orçamento de Estado para o ensino superi or, que prevê menos 4,8% relativamente à estimativa de execução para 2006. Feitas as contas, os sindicatos denunciaram que quatro em cada dez universidades e politécnicos terão no próximo ano falta de dinheiro para pagar os salários dos docentes, o que poderá levar ao despedimento de pessoal docente.

Os reitores manifestaram descontentamento face aos cortes orçamentais. Os politécnicos mostraram-se preocupados com os cortes no orçamento para o sector e os estudantes indignaram-se, acusando o Ministério de "enterrar" o ensino superior.

A assinatura de acordos internacionais com institutos norte-americanos foi também marcante para o ensino superior, sobretudo no que respeita à parceria estabelecida com o Instituto de Tecnologias de Massachusetts (MIT). Ainda no mesmo mês, foi assinado um acordo entre o Estado e a universidade norte-americana Carnegie Mellon, tendo em vista a colaboração com universidades e laboratórios nacionais, estando previsto para breve o arranque da terceira parceria, com a Universidade de Austin (Texas).

Processo de Bolonha

Tendo por cenário um coro de protesto dos estudantes, o ministro da Ciência e do Ensino Superior, Mariano Gago, garante que, no próximo ano lectivo, o número de licenciaturas, no ensino público e privado, adaptadas ao Processo de Bolonha vai aproximar-se dos 90.

Cortes orçamentais

Sindicatos de professores, reitores e directores de politécnicos e estudantes são quase unânimes a considerar que o próximo ano vai trazer dificuldades acrescidas para o ensino superior, uma vez que foi anunciado para 2007 um corte de 4,8% nas transferências de verbas para as escolas.

quarta-feira, dezembro 27, 2006

«Universidades Corporativas ganham forma em Portugal», será o futuro do nosso Ensino Superior??

A Unimed e o Conselho Empresarial dos Vales de Lima e Minho (CEVAL) vão estrear as suas Universidades Corporativas em 2007. Um termo com raízes nos Estados Unidos da América. No [nosso] país, empresas como a SonaeCom aproximam-se do conceito com as suas próprias escolas de negócio.
Foi a General Electric que estreou o conceito nos Estados Unidos, em 1954. Em Portugal, a designação começa agora a ser adoptada. Duas novas estruturas vão emergir no fim de 2007: Universidade Corporativa Unimed e Universidade Corporativa do CEVAL. Com o conceito subjacente, existem em Portugal estruturas como o SonaeCom Learning Centre e a Escola de Negócios do Grupo Lena.

terça-feira, dezembro 26, 2006

«As Universidades e o relatório da OCDE», artigo de opinião de Adriano Pimpão, ex-Reitor da UAlg

A fórmula de gestão não é neutra e a tentação de a reduzir ao modelo empresarial clássico revela desconhecimento dos objectivos e da missão da estrutura sobre a qual se quer aplicar: as Universidades.
O relatório da OCDE (sobre a avaliação do sistema de Ensino Superior), pela sua qualidade e profundidade, marca um ponto importante nos contributos para a reorganização do Ensino Superior. E marca igualmente um maior equilíbrio entre as responsabilidades das instituições e as do poder político. De facto, tendo o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) proposto este tipo de avaliação por entidade credível externa, a decisão política de a mandar executar corresponde à reposição das respectivas competências nos termos legais.
Como é obrigação dos que se habituaram ao livre debate de ideias e à busca com rigor da verdade relativa, a qualidade deste trabalho não o isenta de uma avaliação crítica.
Considero que a questão (e o modelo) da gestão das Universidades assume-se como a chave (mais política do que técnica) do modelo de afectação de recursos, do seu uso eficiente e da produção de resultados.
As Universidades têm uma missão determinada constitucionalmente. Não se trata de uma mera figura de retórica. E também não é, do meu ponto de vista, uma questão meramente ideológica. Trata-se duma avaliação do custo de oportunidade do investimento realizado na qualificação dos recursos humanos e na produção de novos conhecimentos, atrevendo-me mesmo a incluir esta questão na afirmação da soberania nacional. É por isso que o país deve exigir mais das Universidades.
A visão conservadora olha para as Universidades como meras fábricas de diplomas. Aliás, se assim fosse, entraríamos num ciclo com efeito multiplicador no retrocesso do conhecimento, ou pelo menos na endogamia do processo criativo. É para criar condições de ambiente de livre criação, sem constrangimentos políticos, ideológicos ou comerciais, mas com condicionalismos de ordem ética, que se deve falar de autonomia Universitária. Nas suas componentes científica e pedagógica, esta autonomia encontra a sua verdadeira razão de ser; as autonomias estatutária, administrativa e financeira são apenas operacionais e não nucleares. Em consequência, a gestão Universitária não se limita ao nível operacional, mas também ao nível da produção pedagógica e científica e de transferência de conhecimentos para o sector produtivo. O modelo de gestão não é assim neutro, e a tentação de o reduzir ao modelo empresarial clássico revela desconhecimento dos objectivos e da missão da estrutura sobre a qual se quer aplicar tal modelo. Já é diferente a perspectiva de utilizar métodos e técnicas de gestão empresarial na gestão operacional das Universidades.
O estabelecimento dos níveis de decisão e da indicação dos dirigentes para esses níveis deve ser visto na mesma perspectiva da missão específica das Universidades. Os Reitores e os Directores das unidades orgânicas devem ser pessoas competentes e com capacidade para gerir instituições complexas como são as Universidades. Podemos mesmo admitir, como em certos países, um sistema dual de gestão, separando a gestão académica da administrativa e financeira. Com as devidas diferenças, o que hoje se pratica com algumas empresas (existência de um «chairman» do Conselho de Administração e um «CEO») traduz preocupações do mesmo tipo.
Neste sentido, a nomeação do Reitor e mesmo dos Directores das unidades orgânicas, em vez da eleição, não pode ser desenquadrada da questão da autonomia Universitária. Qualquer processo alternativo de nomeação tem de salvaguardar a tentação do controlo político-ideológico das Universidades. Porque o que está em causa não é um mero estatuto profissional, mas a própria produtividade pedagógica e científica dos centros de conhecimento e inovação de que o país precisa.
Uma pergunta final, para repor um pouco a justiça sobre o contributo das Universidades para o desenvolvimento do país: o progresso científico e tecnológico, o avanço em termos de inovação no tecido económico, foi feita onde e por quem?
A minha resposta é que muito de bom foi feito no sistema de Ensino Superior português, o qual possui hoje potencialidades que permitem dar muito mais à sociedade e à economia. Aqui temos sim uma semelhança em relação à realidade empresarial. Assim como as empresas portuguesas, apesar do sucesso em muitos sectores, têm de enfrentar o desafio do aumento contínuo e persistente da produtividade, também as Universidades têm de redefinir o modelo de organização interno e de relacionamento com a sociedade. Também por aqui passará o incremento da sua produtividade específica. Por isso, o sentido da exigência e da responsabilização é a chave principal das grandes transformações que as instituições integrantes deste sistema sempre defenderam, apesar do pouco eco nas instâncias do poder político. Saúda-se por isto este acordar promissor que se espera que transforme em realidade o sonho de construir mais e melhor.
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Adriano Pimpão é professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade do Algarve, instituição da qual já foi Reitor; o seu presente artigo de opinião foi publicado no jornal «Público» do passado sábado [dia 23].

segunda-feira, dezembro 25, 2006

«Uma revolução no Ensino Superior?», opinião do constitucionalista Vital Moreira no "Público"

Que o nosso sistema de Ensino Superior (Universidades e Escolas Politécnicas) precisa de uma profunda reforma - eis uma posição quase consensual, com excepção dos conservadores do costume. Como se sabe, porém, não basta uma opinião generalizada acerca do que está mal, sendo necessárias pelo menos mais duas coisas: uma ideia sobre as reformas a introduzir e a vontade e força política para as realizar. O recente relatório da OCDE encomendado pelo ministro da Ciência e do Ensino Superior dá boas indicações sobre as reformas a empreender. Cabe ao Governo tomar as imprescindíveis decisões políticas.
Não é boa a situação do Ensino Superior entre nós. Nos «rankings» internacionais as Universidades portuguesas ficam numa posição pouco recomendável. A sua internacionalização é comparativamente reduzida. O sistema binário (Ensino Universitário - Ensino Politécnico) foi progressivamente subvertido, com a sobreposição das mesmas formações nos dois sistemas. Muitas instituições não dispõem dos recursos de pessoal docente suficiente, nem de uma cultura pedagógica adequada para uma implementação eficiente do processo de Bolonha (que não se limita a um novo esquema de graus académicos). O sistema de avaliação montado nos anos 90 tinha fragilidades congénitas e ninguém cuidou de tirar consequências das avaliações feitas. Continua a verificar-se uma acentuada endogenia das instituições, com escassa mobilidade do pessoal docente. A proliferação de Universidades e de Escolas Politécnicas gerou uma oferta excessiva, que a diminuição da procura torna mais problemática. O sistema de governo não propicia adequada responsabilidade dos órgãos governativos e a gestão continua submetida a métodos arcaicos. As instituições privadas, com algumas honrosas excepções, ficam aquém dos níveis minimamente exigíveis. As restrições orçamentais e a diminuição de alunos criaram crescentes dificuldades financeiras.
Sem ignorar as boas escolas e as boas práticas também existentes, as deficiências apontadas caracterizam uma óbvia inadaptação do nosso Ensino Superior aos novos tempos, que só uma profunda mudança pode superar.
Obviamente, não era precisa a OCDE para dar conta das dificuldades e dos impasses do actual sistema de Ensino Superior entre nós. Nos últimos anos não têm faltado diagnósticos nem propostas de solução, embora longe de um consenso generalizado. O que se tem verificado é, por um lado, falta de capacidade de auto-reforma das instituições (que o sistema de governo instituído e os interesses estabelecidos inviabilizam) e, por outro lado, ausência de vontade política para uma intervenção de grande fôlego por parte dos sucessivos Governos. Por isso, o referido relatório da OCDE pode trazer o que faltava para uma reforma abrangente do Ensino Superior, designadamente a autoridade de uma organização internacional com o prestígio daquela, bem como um conjunto de propostas prontas a adoptar, assim haja o necessário impulso político. Vejamos as principais propostas.
A ideia mais inovadora é seguramente a que diz respeito à natureza institucional das instituições públicas de Ensino Superior. Tradicionalmente concebidas entre nós como estabelecimentos públicos (como em muitos outros países), ou seja, como serviços públicos dotados de personalidade jurídica, de órgãos próprios e de autonomia administrativa e financeira, as Universidades passariam a ser configuradas como Fundações (mantendo-se, bem entendido, na esfera pública). A "Universidade-Fundação" é um modelo já adoptado em vários países (designadamente a Alemanha) e integra-se no movimento de diversificação e flexibilização dos modos de organização e gestão do sector público, ficando, no entanto, aquém dos modelos mais radicais de empresarialização das Universidades ("Universidade-empresa").
O modelo fundacional tem diversas virtualidades, entre as quais a separação entre o ente "proprietário" (a Fundação) e a Universidade propriamente dita, o recurso a formas típicas da gestão privada no que respeita à gestão patrimonial, financeira e de pessoal, bem como («last but not the least») a possibilidade de recurso ao financiamento de entidades privadas, desde logo pela sua entrada como "fundadores" na Fundação, a par com o Estado. As escolas de Ensino Superior deixam de ser propriedade do Estado, passando a pertencer a entidades distintas (as Fundações), que ficam responsáveis pelos estabelecimentos e pelo seu financiamento.
No que respeita ao sistema de governo, o relatório da OCDE vai inequivocamente no sentido da modificação substancial do regime vigente entre nós, baseado no autogoverno dos estabelecimentos, na base de um sistema quase paritário entre professores e estudantes (a que acresce a participação do pessoal não docente) e assente em órgãos eleitos a todos os níveis (Universidades, Faculdades, Departamentos, etc.), incluindo numerosos órgãos colegiais (Assembleias, Senados Conselhos, etc.), de composição muito vasta. Ora, a direcção hoje indiciada a nível internacional vai claramente no sentido da redução do autogoverno, da diminuição do princípio representativo, da limitação dos órgãos colegiais, do reforço da participação de elementos exteriores aos estabelecimentos.
Embora uma mudança nessa direcção não esteja constitucionalmente vedada - pois o autogoverno das Universidades não está expressamente garantido na Constituição, que se limita a garantir um princípio da participação de professores e estudantes -, é fácil antecipar que esta é provavelmente a reforma que suscitará mais resistências, quer por parte dos professores, quer por parte dos estudantes, sempre em nome da "autonomia democrática" das Universidades e demais escolas do Ensino Superior. No entanto, uma substancial redução dos actuais mecanismos de autogoverno pelos "corpos universitários" - à margem do mundo exterior e dos demais «stakeholders» das instituições de Ensino Superior - é condição essencial para criar um novo paradigma de responsabilidade das escolas do Ensino Superior perante a colectividade e de capacidade de resposta aos desafios da competitividade europeia ("Espaço Europeu do Ensino Superior") e da globalização do Ensino Superior.
Um dos aspectos mais sublinhados no relatório da OCDE é o apoio ao modelo binário de distinção entre o Ensino Universitário e o Ensino Politécnico, que tem vindo a ser "assassinado", com inteira cumplicidade governamental, pela deriva Universitária das Escolas Politécnicas e pela "politecnicização" das Universidades, de tal modo que já são poucos os cursos que não são ministrados em ambos os subsistemas, com a consequente redundância e perda de racionalidade. Embora a distinção da missão que incumbe a cada um deles não exija necessariamente uma separação institucional entre as respectivas escolas, seguramente que ela impede a crescente convergência e duplicação das formações por eles oferecidas. Há que arrepiar caminho, separando águas e estabelecendo as necessárias especializações.
Agora que existe um documento de referência (o relatório da OCDE), o que se espera é que o Governo anuncie rapidamente um documento-base com as suas opções, bem como um calendário dos passos seguintes, proporcionando uma discussão frutuosa na comunidade académica e fora dela. Quase dois anos passados da corrente legislatura, é tempo de passar à acção. Há reformas que levam o seu tempo e que perdem pela demora. Esta é uma delas.
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Vital Moreira é professor na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra e o seu presente artigo de opinião foi publicado no jornal «Público» da passada terça-feira [dia 19], estando (como habitualmente) também disponível na «Aba da Causa», blogue de apoio ao «Causa Nossa» que Vital Moreira mantém com outr@s colunáveis.

domingo, dezembro 24, 2006

«São necessári@s mais clientes!!!» parece clamar o Ministro do Ensino Superior(??!), Mariano Gago

Os portugueses precisam de estudar mais e, independentemente dos seus recursos económicos, terem acesso ao Ensino Superior. É esta a resposta do ministro Mariano Gago ao relatório da OCDE de Avaliação do Sistema de Ensino Superior.
O sector [do Ensino Superior] "precisa urgentemente de se modernizar" e o Executivo [Governamental] apela, agora, à participação do país no debate sobre as orientações que irá propor para o sector. "O Governo tomou boa nota das análises e conclusões do relatório e vai necessariamente agir", garantiu [no passado dia 14] o ministro da Ciência[, Tecnologia] e Ensino Superior, Mariano Gago, depois de a equipa de especialistas ter apresentado o relatório no Centro Cultural de Belém, em Lisboa. Ao país será proposta uma "reforma coerente" não só de "medidas avulsas mas dos objectivos pretendidos para o futuro alargamento da base do Ensino Superior e aumento da capacidade científica e profissional".
A OCDE considera que o aumento do número de alunos do superior, de 17 para 40%, até 2015, e especialmente da taxa de conclusões das licenciaturas é essencial para colmatar a diminuição demográfica do país. Para tal, é necessário que o sector [do Ensino Superior] tenha maior capacidade de resposta às necessidades de mercado. Maior autonomia das instituições, outras fontes de financiamento e a definição de uma estratégia nacional para o sector são recomendadas para se alcançar maior eficiência. Às Universidades também é aconselhado que se internacionalizem.

Mariano Gago promete "abrir debate e tomar decisões para a modernização do Ensino Superior"

São muitas as recomendações feitas pela OCDE para melhorar a qualidade e eficiência do Ensino Superior português. O relatório foi publicamente apresentado em Lisboa [no passado dia 14] mas no final do encontro o ministro da Ciência e do Ensino Superior, Mariano Gago, não quis adiantar nem prioridades nem possíveis caminhos.
"O que posso garantir é que o Governo vai propor ao país um debate e tomar decisões que conduzam à modernização do Ensino Superior português", limitou-se a dizer [Mariano] Gago, considerando que o relatório da OCDE tinha deixado claro que "é urgente definir e implementar um programa coerente de acção". "Neste momento, o Governo toma boa nota das análises e conclusões do relatório [da OCDE] e vai necessariamente agir."
Para os peritos do Comité de Educação da OCDE, Portugal deve assumir dois grandes objectivos: aumentar o nível de participação nas Universidades e sobretudo nos Politécnicos, alargando e diversificando a base de potenciais inscritos, e melhorar os níveis de desempenho e excelência, resumiu Abrar Hassan, coordenador da equipa que, ao longo do último ano, analisou exaustivamente o sistema de Ensino Superior português.
Reduzir as elevadas taxas de abandono no [Ensino] Secundário e incentivar jovens adultos e trabalhadores a regressar aos estudos, designadamente para cursos de curta duração e de carácter mais profissional, permitiria às instituições mais do que compensar a quebra demográfica sentida, lembra a OCDE.
Sobre uma das recomendações mais radicais - a passagem de Universidades e Politécnicos a Fundações, financiadas pelo Estado mas geridas como se fossem do sector privado, e em que os professores perderiam o vínculo ao Estado -, Jon File, da OCDE, explicou que a ideia "não é privatizar o Ensino mas garantir maior autonomia operacional e financeira". A regulamentação do Governo deve ser "reduzida ao mínimo".
Quanto à sugestão de os professores deixarem de ser funcionários públicos, File defendeu que "a liberdade que as Universidades precisam não é compatível" com os trabalhadores terem tal estatuto [de funcionários públicos].
O financiamento do sistema é outro dos aspectos focados no relatório, com a OCDE a dizer que a comparticipação dos estudantes deverá crescer - as propinas cobrem em média 17 por cento do custo real dos cursos, quando noutros países chega a 40 por cento -, mas não para já. Aliás, explicaram os peritos, o próximo passo será mesmo aumentar o investimento do Estado, já que é desejável a criação de um sistema de empréstimos.
Segundo as contas da organização, tal sistema, que implica que os alunos assumam maior responsabilidade no financiamento de algo que lhes vai trazer muitas vantagens no futuro, pagando os empréstimos só depois de estarem a trabalhar e a ganhar um determinado rendimento, custaria, "num período de dez anos, cinco por cento do PIB".

sábado, dezembro 23, 2006

OCDE apresentou relatório da avaliação ao sistema de Ensino Superior português [cf. os documentos]

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) apresentou [no passado dia 14] no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, o relatório de avaliação do sistema do Ensino Superior português que elaborou a pedido do Governo.

O processo de avaliação internacional do sistema de Ensino Superior português foi solicitado pelo Governo à OCDE em Novembro de 2005. Trata-se de uma avaliação extensiva, independente e objectiva de acordo com critérios internacionais, tendo como um dos seus principais objectivos aconselhar e orientar a reorganização e racionalização do sistema à luz das melhores práticas internacionais.

Consulte[m-se] os documentos:

Síntese do relatório da OCDE

OCDE: background report

OCDE: relatório de avaliação do sistema do Ensino Superior português (versão preliminar)

Relatório da OCDE: A avaliação do sistema de Ensino Superior em Portugal [o paleio do Governo]

O relatório de avaliação do sistema de Ensino Superior em Portugal preparado pela equipa internacional designada pela Divisão de Educação da OCDE foi objecto de apreciação prévia pelo Comité de Educação da OCDE, o qual reuniu [no passado dia 14] com o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior para comunicar e discutir as principais recomendações ao Governo e às instituições do Ensino Superior. O relatório realça os avanços significativos registados nas últimas décadas em Portugal, nomeadamente em termos da evolução do número de inscrições no Ensino Superior (de cerca de 30.000 em 1960 para mais de 400.000 em 2000) e do número de doutoramentos atribuídos (de mais de mil por ano nos últimos anos), assim como no que respeita aos recursos financeiros atribuídos ao financiamento do Ensino Superior, identificando os principais desafios que permanecem ao sistema de Ensino Superior, assim como as principais reformas que deverão ser introduzidas em Portugal.

A reforma do sistema, segundo a OCDE, deverá ser integral e profunda, assim como bem fundamentada. É assim reconhecida a importância das várias iniciativas do Governo em promover um conjunto de acções sobre a avaliação do sistema de Ensino Superior (ver, em particular, §1.2 a 1.4 do relatório), tendo em conta a complexidade, apesar da oportunidade de reformar o sistema. A avaliação conduzida pela ENQA sobre o sistema de garantia de qualidade, bem como as avaliações institucionais desenvolvidas pela EUA, European University Association, são exemplos do esforço em curso para a mudança estruturada e organizada com base na experiência internacional. Adicionalmente, o contexto reformista em que se insere a actual acção governativa é considerado como um alicerce estruturante de mudança (§1.39, §2.18, §4.13, §4.15), sendo realçado o contexto político do Plano Tecnológico do Governo (§5.2 a 5.4, §5.63, §7.40) e de iniciativas como as Novas Oportunidades (§4.12, §4.16, §7.24).

Neste âmbito, o Compromisso com a Ciência do Governo (§5.5, §7.2) é especialmente referido no documento elaborado pela equipa da OCDE como estruturante para a formação dos portugueses no espaço europeu e o desenvolvimento da sociedade. O crescimento considerável do sistema de ciência e tecnologia durante as ultimas décadas é reconhecido (§5.10), sendo o aumento continuado de doutorados e do âmbito de intervenção das unidades de I&D considerado como fundamental para o desenvolvimento efectivo de um sistema de investigação e inovação integrado internacionalmente (§7.2).

As mudanças introduzidas pelo Processo de Bolonha são consideradas no documento elaborado pela OCDE uma oportunidade inédita para as instituições promoverem a qualidade do ensino (§7.52), bem como atrair novos públicos para o Ensino Superior (§1.23, §1.32, §2.23) e alargar a ligação ao exterior, nomeadamente à sociedade em geral e às empresas em particular. A OCDE reconhece, em particular, a importância da nova legislação introduzido pelo Governo em 2006 (§2.4, §7.26), nomeadamente no que respeita ao reforço do sistema binário de Ensino Superior, salientando a necessidade de clarificar as missões distintas dos Institutos Politécnicos e das Universidades (§7.24).

Cabe agora aos responsáveis dos Institutos Politécnicos e das Universidades levar a cabo as recomendações e as exigências das qualificações distintas (§2.45, §4.26 a 4.28).

As acções estratégicas do Governo em matéria de reforço das condições de internacionalização dos sistemas de ensino superior e de ciência e tecnologia são particularmente reconhecidas, sendo salientada a necessidade de estender e aprofundar o esforço de investimento com as parcerias com o MIT e a Carnegie Mellon University (§5.62, §7.67), nomeadamente como forma de incentivar a integração de instituições nacionais em redes científicas emergentes a nível internacional. O Instituto Ibérico de Nanotecnologia (§5.63) é outro dos exemplos considerados de promoção da cooperação internacional e de ligação do ensino com a ciência. De uma forma geral, a internacionalização deverá ser uma componente integrante de todas as instituições do ensino superior (§5.60 a 5.69), estimulando a mobilidade de estudantes e docentes do ensino superior (§5.56 a 5.59) e reforçando a actividade científica e académica em rede (§7.68).

As recomendações propostas pela OCDE organizam-se em seis grandes tópicos, como resumido seguidamente, com referência aos parágrafos específicos do relatório da OCDE: 1) coordenação e gestão do sistema; 2) governação e estatuto legal; 3) financiamento e eficiência do sistema; 4) acesso e equidade 5) qualidade e excelência nos sistemas de ensino superior e de ciência e tecnologia; 6) abertura das instituições à sociedade.

1. Coordenação e gestão do sistema

A necessidade de articular o sistema de ensino superior com o ensino secundário e o sistema de C&T, assim como com o mercado de trabalho e os empregadores e a sociedade em geral, é identificada como prioritária (§2.34). Deste modo, a OCDE propõe que o Conselho Coordenador do Ensino Superior (CCES), recentemente introduzido através da nova lei orgânica do MCTES, seja constituído ao mais alto nível com representantes do governo, das empresas e da sociedade civil, de forma a articular os vários interesses subjacentes a um sistema de ensino superior actualizado e articulado com as prioridades nacionais (§2.35, 2.62). O CCES deverá definir e acompanhar a estratégia nacional para o ensino superior e garantir condições para o desenvolvimento e crescimento do sector do ensino superior de forma diversificada (i.e., incluindo uma rede alargada de formação pós-secundária, politécnica e universitária, assim como cursos vocacionais e actividades sistemáticas de aprendizagem ao longo da vida; §7.14 a 7.16). O seu funcionamento deverá ser apoiado pela profissionalização gradual de serviços de apoio ao desenvolvimento de políticas de ensino superior.

O Ensino Superior deverá responder às necessidades dos jovens que terminam o Ensino Secundário, mas também aos adultos que procuram cursos vocacionais, profissionais e aprendizagem ao longo da vida. O reforço do sistema binário de forma clara e inequívoca é apontado como um objectivo a alcançar (§7.23 a 7.25), devendo o ensino politécnico ser revisitado no sentido da sua especialização ao nível da formação pós-secundária e de 1º ciclo (§7.26). Pelo contrário, o Ensino Universitário deverá facilitar o reforço da pós-graduação, sendo referida especificamente a oportunidade de Portugal desenvolver um sistema de escolas de pós-graduação (§7.58). A OCDE recomenda, em particular, a consolidação da actual rede de instituições do Ensino Superior através de programas claramente diferenciados para os vários níveis de ensino, devendo ainda ser efectivamente concretizadas parcerias entre diferentes instituições a nível regional, enquanto forem respeitadas as missões distintas de Universidades e Politécnicos (§7.21 e 7.22).

2) Governação e estatuto legal das instituições do Ensino Superior

O actual sistema de governação das instituições de Ensino Superior é considerado como esgotado face aos desafios que emergem. Neste sentido, a OCDE recomenda uma maior diversificação do sistema de governação das instituições (§2.46 e 2.47), podendo implicar alterações no estatuto legal de algumas instituições em função do seu desempenho (§7.32). Em particular, deverão ser estudadas as possíveis modalidades legais, nomeadamente ao nível do desenvolvimento de fundações, de forma a viabilizar a institucionalização de corpos próprios de docentes e funcionários não-docentes, assim como sistemas autónomos de gestão de recursos humanos (§3.21, §7.33). O governo deverá utilizar um sistema de contratos institucionais de forma a garantir o cumprimento de objectivos pré-definidos e substituir gradualmente o mecanismo de distribuição do financiamento público de base das instituições por uma fórmula, como introduzido em Portugal no início dos anos 90 (§7.32). Em geral, deverá ser promovida uma maior autonomia das instituições em relação às suas próprias decisões de gestão e governação, o âmbito da qual deverá ser função do tipo e desempenho de cada instituição (§7.34).

O sistema de governo das instituições do Ensino Superior deverá ser aberto à sociedade e centrado num conselho com uma maioria de membros externos à instituição, incluindo o seu Presidente (§3.22, §7.34). Os reitores das Universidades e os presidentes dos Institutos Politécnicos não deverão ser eleitos, mas nomeados após um processo de selecção por esse conselho segundo padrões internacionais. Os presidentes das unidades orgânicas, escolas e departamentos deverão ser também nomeados por esse mesmo conselho, após recomendação pelo reitor ou presidente. Adicionalmente, é ainda proposto que a gestão interna das instituições (nomeadamente ao nível de recursos humanos e financeiros, equipamentos e instalações) seja assegurada por Conselhos Executivos com o máximo de 10 membros, incluindo um aluno, devendo ser todos internos às próprias instituições.

3) Financiamento e eficiência do sistema

Segundo a OCDE, o sistema actual manifesta numerosas ineficiências (§6.44, §7.39 a 7.41), nomeadamente ao nível da duplicação de cursos e programas de estudo com baixa atractividade e de uma insuficiente cooperação e colaboração entre instituições de forma a permitir uma maior mobilidade de estudantes. Por outro lado, os programas de ensino e as qualificações obtidas deverão ser melhor adequadas ao mercado de trabalho, devendo as instituições obrigarem-se a disponibilizar informação detalhada sobre a empregabilidade dos seus graduados (§7.55).

Após um período de concentração de esforços na optimização da eficácia do sistema de Ensino Superior e de racionalização da oferta pelas várias instituições, o sistema deve então ser preparado para crescer em dimensão, nomeadamente através do reforço do investimento público e privado (§6.42). Estes objectivos requerem, no entanto, uma adequada concentração nos objectivos, desempenho e mecanismos de prestação de contas, para os quais as instituições se devem preparar (§6.51). A OCDE aplaude a estratégia em curso de investimento em ciência e tecnologia, a qual deverá ser continuada até as metas inscritas no Plano Tecnológico e no Compromisso com a Ciência do Governo serem atingidos (§6.43, §7.40).

A OCDE recomenda, em particular, que o actual sistema e nível de propinas seja mantido, nomeadamente para a formação inicial, podendo vir a ser revisto quando Portugal conseguir atingir níveis superiores de participação no Ensino Superior (§6.46).

O financiamento público das instituições do Ensino Superior deverá evoluir para um sistema de contratos institucionais com base em planos estratégicos e indicadores de desempenho, sempre ligado aos objectivos nacionais (§6.50, §7.32). A OCDE propõe, em particular, uma maior diversificação entre as instituições do Ensino Superior que deverá repercutir-se na forma de financiamento individualizado, o qual deverá substituir gradualmente o mecanismo actual de distribuição do financiamento público por uma fórmula (§6. 53 e Tabela 6.6).

4) Acesso e equidade do sistema

A participação no ensino superior deverá aumentar a todos os níveis (§2.43, §7.38). Mais de 15% dos alunos em Portugal não termina o 9º ano e 60% não termina o 12º ano. Adicionalmente, perto de 40% dos alunos do ensino superior não terminavam o seu curso em 2003. Neste contexto, a equipa da OCDE propõe a necessidade de Portugal vir a considerar no longo prazo um aumento do esforço colectivo de investimento público e privado no Ensino Superior (§7.17 a 7.19), nomeadamente após melhorias efectivas na eficácia do sistema a curto prazo. Todavia, o Governo deverá estudar a hipótese de criar modalidades de empréstimos para os estudantes do Ensino SPuperior, à semelhança de práticas consolidadas na OCDE (§6.28 a 6.36 e §7.47 e 7.48). Adicionalmente os custos de estruturas típicos da acção social devem ser reduzidos, nomeadamente através da implementação de contratos institucionais que facilitem a optimização dos serviços directos e indirectos aos alunos (§7. 49).

5) Qualidade e excelência no Ensino Superior e em Ciência e Tecnologia

O sistema português de ensino superior deve ter como objectivo alcançar níveis superiores de qualidade e excelência, particularmente nos sectores Politécnico e privado (§7.51). Os actuais níveis de insucesso em todo o sistema de Ensino Superior, apesar de comparáveis àqueles observados noutros países, devem ser objecto de particular preocupação das instituições do Ensino Superior. Todas as instituições deverão demonstrar níveis de qualidade em termos de liderança, desenvolvimento curricular, desempenho pedagógico, viabilidade financeira e capacidade de garantir o acesso aos recursos existentes (§7.52 a 7.55). Formas de acreditação de novos programas deverão ser objecto de rigorosas avaliações por autoridades independentes e externas, como proposto pela ENQA (§4.43 e §7.50). As avaliações externas deverão ser feitas de forma regular a todos os programas de estudo e a todas as instituições.

A OCDE identifica as unidades de I&D e os laboratórios associados como agentes particulares de mudança e de dinamização do sistema (§5.39), sendo realçada a necessidade de reforçar a exposição das universidades a ambientes de crescente competitividade e prestação de contas, nomeadamente ao nível do desempenho científico e pedagógico (§5.38). As unidades de I&D deverão agora ser reforçados de forma a criar maior e melhor especialização em determinadas áreas científicas. Trata-se de garantir as necessárias massas críticas ao desenvolvimento científico e à especialização do conhecimento que emerge. Nesse sentido, deverão ser desenhados e implementados novos sistemas de carreiras académicas e de investigação, nomeadamente com forma de reduzir a endogamia nas universidades e facilitar a mobilidade de docentes e investigadores (§7.59, 7.63). A facilitação de estratégias autónomas de gestão de recursos humanos deverá acompanhar a revisão do estatuto legal das instituições de Ensino Superior, pelo menos sempre que o seu desempenho o recomende, viabilizando o reforço diferencial e progressivo da autonomia das instituições (§7.32).

6) Abertura das instituições do Ensino Superior à sociedade

A OCDE refere também que as instituições do Ensino Superior encontram-se de forma geral excessivamente fechadas e pouco ligadas às necessidades da sociedade (§5.40 a 5.46) e às exigências do mercado de trabalho (§7.61). A OCDE considera que as instituições do Ensino Superior manifestam uma insularidade que urge ultrapassar, nomeadamente através de uma efectiva abertura dos órgãos de gestão das instituições à comunidade (§7.65 e §7.66). Consultas sistemáticas e alargadas com empregadores, associações profissionais e estudantes sobre mudanças e padrões de empregabilidade, bem como de expectativas ligadas ao mercado de trabalho, devem ser promovidas de forma sistemática e continuada.

A insularidade das instituições, que no caso particular das Universidades se reflecte em níveis excessivos de endogamia na contratação dos seus docentes, foi identificada como um problema que afecta a produtividade e a eficiência de todo o sistema (§7.64). Neste contexto, refere a OCDE, as instituições devem adoptar estratégias mais pró-activas de internacionalização, usando nomeadamente o tipo de parcerias entretanto desenvolvidas pelo Governo, devendo ainda incluir o desenvolvimento de programas de estudo em língua inglesa e a oferta de graus duplos com parceiros estrangeiros (§7.67 e §7.68).

O relatório de avaliação do sistema de Ensino Superior em Portugal preparado pela equipa internacional designada pela Divisão de Educação da OCDE a pedido do Governo português foi apresentado [na passada] quinta-feira (14 Dezembro) no Centro Cultural de Belém, em Lisboa.

Solicitado em Novembro de 2005, o relatório é uma avaliação extensiva, independente e objectiva de acordo com critérios internacionais, visando aconselhar e orientar a reorganização e racionalização do sistema à luz das melhores práticas internacionais.

O MCTES colherá do documento as apreciações julgadas oportunas para uma reforma integral e profunda do sistema de Ensino Superior português.

Equipa de avaliadores

A equipa de avaliadores nomeados pela OCDE que elaborou o relatório de avaliação do Ensino Superior em Portugal incluiu os seguintes peritos: Abrar Hasan (coordenador da equipa da OCDE), Daniel O’Hare (da Irlanda), Michael Gallagher (da Austrália), Jon File (do Reino Unido), Jane Wellman (dos Estados Unidos) e Paavo Lopponen (da Finlândia). A equipa visitou Portugal durante duas semanas em Maio e reuniu com responsáveis de instituições do Ensino Superior público e privado, Universitário e Politécnico, com Associações de Estudantes, Conselho de Reitores, com a Comissão de Educação do Parlamento, com políticos, empresários, associações de empregadores, associações de sindicatos e ex-ministros do Ensino Superior.

sexta-feira, dezembro 22, 2006

Universidades passarão a poder escolher o seu Reitor fora dos seus próprios quadros de docentes

Um professor da Universidade de Lisboa poderá vir a candidatar-se ao cargo de reitor de um estabelecimento no Porto. E vice-versa. A reforma do Ensino Superior só deverá ser apresentada no Verão mas, ontem, no Parlamento, José Sócrates anunciou que os reitores passarão a ser nomeados por um órgão máximo que assegurará "a direcção estratégica" das instituições e será composto maioritariamente por docentes. O Governo pretende, ainda, que as Universidades "se abram à sociedade", se internacionalizem, sejam mais autónomas, eficientes e diversifiquem os seus modelos de gestão.

"Temos obrigação de fazer mais com os mesmos recursos", concluiu José Sócrates, à saída da Assembleia da República.

A reforma do Ensino Superior foi o tema do debate mensal. O sistema de empréstimos a estudantes universitários e a nomeação dos reitores pelo Conselho-Geral ou Senado foram as medidas mais contestadas pela Oposição.

O confronto parlamentar revelou-se estéril. Jaime Gama ainda brindou a Oposição e Governo com mais hora e meia de debate, mas o tempo não foi minimamente aproveitado. O primeiro-ministro foi acusado de enumerar ao Parlamento orientações genéricas de uma reforma que só será apresentada daqui a seis meses e que, por isso, só serviu "para marcar calendário". Durante quatro horas, Sócrates repetiu que a Oposição não fez propostas porque quer tudo na mesma.

Há seis meses, o PSD apresentou um projecto de lei sobre a autonomia das universidades que "vai de encontro às orientações" anunciadas pelo primeiro-ministro. A diferença é que não são intenções, mas propostas concretas, reivindicou Marques Mendes. Outra divergência, referiu, é que os sociais-democratas consideram que o órgão máximo colegial deverá ser maioritariamente composto por pessoas externas às Universidades.

"Estamos aqui a discutir propostas que o Governo não apresentou. Vai mudar tudo na avaliação, mas o quê? E o que é essa ideia generosa de abertura à sociedade?", afirmou Francisco Louçã, do BE, insistindo que o "Ensino Superior não tem de andar de braço dado com o poder económico". O líder comunista, Jerónimo de Sousa, também alertou para os perigos do sistema de empréstimo como forma de financiamento dos cursos superiores. José Sócrates deu, basicamente, duas respostas confrontou o PSD com responsabilidades por no passado não ter feito a reforma, acusou PCP e BE de serem "conservadores".

quinta-feira, dezembro 21, 2006

«Educação, S.A.», opinião de José Soeiro

Dizem os jornais de hoje que o Governo quer levar o Ensino Superior ao último debate do ano no Parlamento. Quem poderá ter pensado que um primeiro-ministro socialista poderia vir falar de Educação pública, de políticas de igualdade para combater o insucesso, de universalização do acesso como condição da democracia, do reforço da participação na gestão, da abertura das Universidades a novos públicos, desengane-se. Este Governo não tem nada de socialista e o debate de hoje é para anunciar um funeral: a ideia de Educação pública como direito de cidadania garantido pelo Estado deve ser enterrada. Sócrates vem falar de outra coisa: da Educação S.A..

Se houve um tempo em que à social-democracia se associou a ideia de um compromisso entre capitalismo e democracia que, através dos direitos sociais, garantisse patamares mínimos de igualdade que dessem conteúdo à cidadania (o direito à Educação, à Saúde, a Segurança Social pública, etc.), esse tempo acabou. A suposta "esquerda moderna" tem hoje outro projecto, que pressupõe a destruição do Estado Social em nome da adaptação às realidades do capitalismo globalizado. Esse projecto une todo o campo do situacionismo que desistiu de construir uma sociedade mais justa. O neoliberalismo é a prática política desse campo e [José] Sócrates é hoje o seu protagonista mais cumpridor.

O Ensino Superior é uma das áreas em que tal programa é evidente. Sob a retórica tecnocrática em torno da inovação tecnológica, através do discurso gestionário sobre a necessidade de tornar "eficazes" as instituições, com a assunção elitista de que a democratização está feita ou é impossível, o Governo vai aplicando afoitamente a receita neoliberal à Educação.

Os exemplos mais recentes são gritantes: cortes orçamentais inéditos no financiamento (superiores a 6%, mais a fatia de 7,5% por conta dos descontos para a Caixa Geral de Aposentações); desqualificação da formação reduzindo as licenciaturas a um ciclo de três anos (através de Bolonha); apelos à substituição da gestão democrática (tão "ineficaz", tão "causadora de ruído", tão "morosa"...) por modelos «managerialistas»; despedimento de docentes (centenas de professores têm vindo e virão para a rua este ano); «bolseirização» da investigação sem criação de verdadeiras carreiras e condições para que ela se desenvolva; continuação da actualização do valor das propinas que ultrapassa já os 900 euros...

De facto, se a implementação do processo de Bolonha não tivesse tornado clara a agenda liberal para o Ensino Superior, o anúncio feito esta semana por Mariano Gago, segundo o qual o Governo está já a negociar com entidades bancárias a criação de um sistema de empréstimos para que os estudantes paguem a sua formação, não deixa dúvidas nenhumas. O que está em causa é grave. Já não se trata apenas de sermos "um dos países da OCDE que menos investe" nesta área (como reconhece o próprio relatório). Já não se trata só de substituir o financiamento público através dos impostos - em que quem é mais rico paga mais - por um financiamento directo socialmente injusto através das propinas. Trata-se de eliminar completamente a própria ideia de solidariedade intergeracional que é fundadora de uma responsabilidade pública. O que se pretende é dizer, de uma vez por todas, que a Educação não é um direito: quem quer Educação tem de pagar directamente por ela, nem que seja mais tarde, através de um empréstimo que será pago (com juros) quando a pessoa trabalhar.

O relatório da OCDE, divulgado no passado dia 14, insere-se exactamente nesta linha, quando recomenda a transformação das instituições de ensino superior em fundações financiadas parcialmente pelo Estado, mas geridas como sector privado, em que os professores e trabalhadores não tenham vínculo ao Estado e deixem de ser funcionários públicos.

Estas medidas são todo um programa, são todo um projecto de sociedade: as escolas como empresas, os estudantes como clientes, os professores e funcionários como empregados de uma empresa que deve, no limite, assegurar o seu financiamento e (porque não?) gerar lucro.

A Educação S.A. é só mais uma vertente deste projecto que está em marcha e que precisa de ser derrotado pela crítica e pela mobilização. Desde logo, em nome do ensino superior público. Mas também, obviamente, em nome de uma política que seja socialista.
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José Soeiro é dirigente dos Jovens do Bloco de Esquerda e membro da Mesa Nacional do mesmo partido.
O presente artigo de opinião de José Soeiro foi publicado no portal Esquerda.net, aconselhando-se também a leitura de um seu anterior artigo «A Educação como privilégio? (Reflexões sobre o movimento dos estudantes do Ensino Superior)», publicado na revista da UDP, «A Comuna», nº 3, de Novembro de 2003.

Financiamento do Ensino Superior passará a ter em conta a avaliação de desempenho das Instituições

O primeiro-ministro [José Sócrates] disse hoje no Parlamento que o financiamento público do Ensino Superior terá um sistema de contratos institucionais com base em indicadores de desempenho e mecanismos para premiar a obtenção de fundos próprios por parte das instituições.

No debate mensal do Governo dedicado à reforma do Ensino Superior, José Sócrates disse que o novo sistema de contratos institucionais, tendo como base planos estratégicos e "indicadores de desempenho, substituirá gradualmente o mecanismo actual de distribuição do financiamento baseado apenas numa fórmula uniforme".

"Serão introduzidos mecanismos para estimular e premiar a obtenção de fundos próprios por parte das instituições. Financiar Universidades segundo os seus resultados e valorizar aquelas que conseguem multiplicar as suas fontes de financiamento é a maneira mais moderna de sustentar o desenvolvimento do Ensino Superior", sustentou o chefe do Governo.

O primeiro-ministro disse que o Governo quer "reduzir o número de cursos, racionalizar a rede de escolas, estimulando as associações e parcerias (sem esquecer o contributo do Ensino privado), qualificar a gestão e melhorar o desempenho".

Actualmente, o Ensino Superior é financiado tendo em conta a percentagem do Produto Interno Bruto gerado pela economia, situação que se irá manter, disse ainda José Sócrates.

"Igualmente, deve manter-se o actual nível de comparticipação das propinas pagas pelos estudantes no financiamento dos cursos do primeiro ciclo" do Ensino Superior.

No entanto Sócrates advertiu que, a prazo, "em função dos resultados e do aumento da frequência, o nível dos recursos deverá crescer em linha com a importância que este sector tem para a modernização do país".

«Os equívocos provocados por uma avaliação externa», opinião de Virgílio Meira Soares

O dia 22 de Novembro de 2006 ficará na memória de muitos como aquele em que se deu a conhecer publicamente as fraquezas do nosso sistema de avaliação do Ensino Superior.
Sempre afirmei que foi uma iniciativa positiva, que se impunha ao fim de dez anos de trabalho, e apoiei publicamente o ministro por isso. Esperava o alarido que se fez sobre o que escreveram e disseram os peritos estrangeiros. Esperava, também, que os aspectos positivos apresentados nesse relatório fossem negligenciados por quem só gosta de apontar o que está, ou esteve, mal. Sabia que pouca gente alguma vez se daria ao trabalho de ler o relatório de auto-avaliação elaborado e que serviu de base ao trabalho dos peritos (devo ressalvar o artigo de Isabel Leiria no PÚBLICO, isento e que demonstrava estudo). Tinha consciência de que todo o trabalho crítico e autocrítico publicado pelo Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior (CNAVES) havia sido ignorado pela maioria daqueles que rejubilam com o que dizem os peritos estrangeiros, sem que se dessem ao cuidado de verificar que, felizmente, o que estes disseram já havia sido dito e escrito por portugueses.
Uma leitura das obras recentes de autores como Veiga Simão, Machado dos Santos e Almeida e Costa demonstraria à saciedade a consciência que existe do que vai mal e, também, do que vai menos-mal. E uma leitura da publicação «CNAVES (2006) Avaliação - Contributos para a Reformulação» mostraria a clara consciência do que não ia mesmo bem, como uma leitura do relatório de auto-avaliação mostraria que os peritos validaram aquilo que já se sabia.

Na referida publicação do CNAVES pode ler-se:

1) Se, por um lado, se detectou, através de relatórios de progresso e ao longo do segundo ciclo de avaliação, que muitas instituições deram seguimento às recomendações das comissões de avaliação externa, não deixa de ser constrangedor o silêncio do ministério da tutela e a displicência com que tratou os resultados. O argumento, muitas vezes ouvido, de que os relatórios não eram suficientemente conclusivos (houve até quem lhes chamasse "redondos"!), não resiste a uma leitura atenta. A questão que se pode pôr é se alguma vez eles foram devidamente analisados e tomados a sério. Tudo leva a crer que não, e é pena. Um tão grande investimento deveria ter sido levado a sério por quem tem a responsabilidade de dar contas da aplicação dos dinheiros públicos. Entretanto, a sociedade foi mantida à margem do processo, passando-se a imagem de que a avaliação em Portugal não existia ou era uma actividade pouco transparente.

2) Embora a situação [da internacionalização] tenha melhorado substancialmente no segundo ciclo, este assunto merece ser olhado com a devida seriedade, dada a necessidade de garantir a continuação do reconhecimento internacional dos nossos processos, agora no âmbito mais geral do espaço europeu do ensino superior, seguindo os critérios propostos pela ENQA e aceites pelos ministros responsáveis pelo Ensino Superior, em Bergen, em Maio de 2005. O baixo número de estrangeiros (embora maior durante o segundo ciclo) tem diversas origens, sendo de salientar duas: as limitações orçamentais e o facto de a maioria das instituições exigirem que a avaliação seja realizada em língua portuguesa (no que estão protegidas pela lei). Este último facto acrescenta mais uma "deficiência" no processo: encontramo-nos limitados a convidar peritos que entendem a língua portuguesa, sendo, portanto, maioritários os brasileiros e os falantes da língua castelhana. (...) As decisões não podem, nem devem tardar. O que não parece razoável é tentar reduzir a internacionalização à exigência, manifestada por algumas pessoas, de as comissões de avaliação externa serem exclusivamente constituídas por estrangeiros.

3) A participação de peritos da sociedade civil foi uma das preocupações de quem dirigiu o primeiro ciclo e, naturalmente, continuou no segundo ciclo, como se demonstrará. (...) Será desejável uma profunda alteração para futuro. Tal, porém só terá expressão a partir do momento em que cada comissão de visita (normalmente constituída por quatro pessoas) só tenha um universitário português [curiosamente esta proposta é retomada pelos peritos]. Desse modo, poderá aumentar-se a participação de peritos externos e de peritos estrangeiros, com vantagem.

4) Este é um assunto [a propósito da preparação técnica dos avaliadores] que importa ser abordado prioritariamente, a bem do sucesso de qualquer processo de avaliação. Não parece possível continuar a aceitar certos comportamentos nem relatórios "pobres" ou inconsequentes que só contribuem para desacreditar a avaliação.

No relatório de auto-avaliação resumem-se, nas conclusões, os pontos fracos. Não merece a pena ser exaustivo, mas vale a pena referir alguns aspectos:
1) A complexidade da estrutura organizacional dificulta a eficiência e dilui as responsabilidades. (...) Estão criadas as condições para uma estrutura mais operacional e eficiente, sem pôr em causa o modelo contratual.
2) Como consequência da estrutura organizacional, o apoio técnico e administrativo está fragmentado em vários secretariados de pouca consistência. (...) O orçamento global é significativo, mas a sua divisão por cinco entidades não permite a existência de uma massa crítica em nenhum dos secretariados.
3) A dificuldade em estabelecer um processo apropriado de acompanhamento [é uma fraqueza]. É quase inexistente.
4) A total omissão no que respeita às consequências a partir dos resultados da avaliação, nos termos da lei [nos vários níveis de responsabilidade], bem como a paralisia do ministério em relação à avaliação dos resultados [é outra fraqueza].
5) Não foram tomadas atitudes nos poucos casos de recusa de uma instituição se submeter à avaliação.
6) Como consequência de tantas omissões, a imagem do sistema de avaliação está deteriorado aos olhos da opinião pública.

Há um ponto de discórdia com os peritos no que respeita ao modo como fazem as observações sobre a independência das comissões de avaliação, mas não é uma profunda discórdia.
Seria então necessária a avaliação externa se o diagnóstico estava feito, e veio, na sua maioria, a ser confirmado pelos peritos? Pessoalmente considero que foi da máxima importância. Uma auto-avaliação deve ser sempre validada, ou não, por pessoas externas ao sistema e, por isso é de louvar a iniciativa.
Porém, o que acho incompreensível é tentar-se fazer do CNAVES o bode expiatório de erros acumulados que poderiam ter sido evitados pelo poder político. Com todas as deficiências conhecidas e reconhecidas, o CNAVES cumpriu a lei da República. Poderia ter sido mais "pró-activo" e não foi. Mas quando o foi, ninguém o ouviu.
É, por isso, chocante assistir, sem protestar, à sua crucificação por quem nem sequer se deu ao trabalho de estudar o assunto.
Foi bom que o público soubesse o que foi feito, e não feito, com o dinheiro dos seus impostos. Também seria bom que todos os envolvidos não sacudissem a água do capote e deixassem de apontar todos os erros a quem só tem responsabilidade em parte deles.
A tudo isto acresce que, em especial, os membros do CNAVES nomeados pelo Governo, por mandatos de cinco anos, estiveram a fazer um serviço pelo qual deveriam ser reconhecidos, e não humilhados.
Bem pode o Governo tentar fazer passar a ideia de que a avaliação deve ser uma das componentes essenciais de uma sociedade moderna. Nada conseguirá, enquanto a mentalidade que prevalecer é considerar-se uma avaliação como o encontrar de um culpado do que está mal, em vez de tirar as lições para o futuro. Ou será que tudo não passa de um equívoco?
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Virgílio Meira Soares é presidente do Conselho de Avaliação da Fundação das Universidades Portuguesas, é professor catedrático da Faculdade de Ciências da Universi­dade de Lisboa, foi Reitor da Universidade de Lisboa (de 1986 a 1998), sendo membro da Direcção do Centro de Investigação de Políticas de Ensino Superior (CIPES), desde a sua fundação. O presente artigo de opinião da autoria de Virgílio Meira Soares foi publicado no jornal «Público» de hoje [21 de Dezembro].

Irão: Ensino deve ser laico ou confessional??

'Mass purges' at Iran Universities
Iranian students say there is a second Cultural Revolution under way in the Universities with scores of professors forcibly retired and politically active students being threatened with expulsion.
Student anger exploded with an unprecedented show of defiance when President Mahmoud Ahmadinejad went to Tehran's Amir Kabir University on 12 December.

Pictures shot on a mobile phone showed angry students chanting against the President, accusing him of being a fascist and a puppet of the hardliners.

They held portraits of Mr Ahmadinejad upside down to mock him and then set them on fire.

The day before the President visited, the University was in turmoil with students shouting "Death to the dictator".

Iranian television only showed a few seconds of the disturbance. Later Mr Ahmadinejad put a brave face on it saying the protest showed there was freedom of speech in Iran compared to his student days under the Shah.

'Harassment and purges'

When Mr Ahmadinejad came to power the Universities were quiet.

But by trying to stop students getting involved in politics, the new Government has antagonised them.

"They have stepped up the pressure to scare students," says activist Ali Nikoo Nesbati.

"We think they've done this on purpose to frighten us; to send a message that if you want to be politically active you will have problems in the future," he says.

According to student activists 181 students have received letters warning them not to get involved in politics, while 47 student publications and 28 student organisations have been closed in the last year.

"They threatened me that if I talked to the media it might make things much worse for me," says Mehdi Aminzadeh, who has been banned from doing a masters in political science because he has been too active in politics.

"But if we keep silent it's easier for them to do the same things to other people," he says.

'Three-star students'

Mr Mehdi has twice been arrested and still has court cases pending against him.

He is what is known perversely in Iran as a three-star student. That means he has three bad marks against his name for political activism - enough to be banned from the University.

"We are not working against the system here," says fellow student Mohammad Gharib Sajadi, who has also been banned.

"The Constitution has given us this right to Education," he says.

"Freedom of speech is being restricted more than before in Iran," says Iran's Nobel Peace Prize winner and human rights lawyer Shirin Ebadi.

"They think students should go to their classes, read their books and then go back home and shouldn't get involved in the social and political issues around them in society - that's asking a lot!"

But President Ahmadinejad denies that his Government is harassing students.

He says it has created an open atmosphere in the Universities.

"The ears of the Government are open to hear them," he said referring to student demands during a news conference.

Turban incident

It was the President who appointed a cleric for the first time since the Revolution to head Tehran University - the country's most political and prestigious University.

Mr Ahmadinejad told journalists the chancellor should be friendly with the students, moving among them and visiting their dormitories - otherwise he should give up his job to someone else.

The first time the new chancellor entered the University, students protested by knocking off his turban - a sign of extreme disrespect for a cleric.

"If I had not been well protected I would have been suffocated and there was a possibility of a crime like murder being committed," said the chancellor, Ayatollah Amid-Zanjani, after the incident.

However he added that "students have the right to protest".

The chancellor denies student allegations that there have been 17 protests against him inside Tehran University in the last year alone.

He says apart from the turban incident there was only a protest on Iranian Students' Day on 6 December, which, he said, was attended by at most 40 people.

'Cleaning the slate'

The photographs of the event showed the crowd was much bigger.

And there is mobile phone footage from a demonstration in the summer at which the posters make it pretty clear what the students think of their new Ayatollah-turned-chancellor.

"This is not a religious Seminary - it's a University," read one poster.

But it is not just students who are angry - professors have also faced problems.

The new chancellor forcibly retired 45 teachers from Tehran University. He said they were past the retirement age, although they were younger than him.

"The majority of the retired teachers couldn't reach the standard of a full professor after 30 years of teaching at this University. They didn't manage to do any research to improve their position," Ayatollah Amid-Zanjani said.

"It seems this is the start of a project to clean the slate - to get rid of those intellectuals who are secular opponents of the Government," says student activist Abdullah Momeni.

He believes the purge started after President Ahmadinejad spoke about the need to remove secular and liberal thought from the Universities.

Students complain the international community is not paying enough attention to the worsening human rights situation in Iran because of the obsession with the nuclear issue.

"The Islamic Republic has managed to focus the international community's attention on Iran's nuclear case and the possibility of an Israeli attack. That has diverted attention from the human rights situation in Iran," says Mr Nesbati.

He believes it is possible that one day Iranian officials will solve the nuclear crisis but "in the mean time they will have crushed all their internal critics".

Venezuela: Ensino deve ser laico ou confessional??

O Presidente Hugo Chávez disse ontem que na Venezuela "não há presos políticos, mas políticos presos", numa resposta a um pedido de amnistia feito pela Conferência Episcopal Venezuelana (CEV). Numa carta aberta, lida na terça-feira pelo bispo Ramón Viloria, os líderes da igreja católica do país pediram ainda que o "socialismo do século XXI" defendido por Chávez, "não se inspire na filosofia marxista".

Numa alusão ao grupo detido durante 2002 e 2003, após o fracassado golpe de Estado contra si, Chávez lembrou que "um terrorista preso não é um preso político". Na missiva, a CEV pedia um perdão para os prisioneiros que estão a ser submetidos a processos judiciais por acções relacionadas com factos políticos. E lembrava "a amplitude que sempre caracterizou o exercício do poder na Venezuela e que também foi aplicada" a Chávez em 1994, dois anos após o golpe contra Carlos Andrés Pérez.

A Conferência Episcopal felicitou o Presidente pela obtenção de um novo mandato nas eleições de 3 de Dezembro, mas deixou também um recado: "Esperamos que a sua proposta de socialismo do séc. XXI seja uma via de transformação do país, aberta à transcendência e à religião, que promova a inclusão de todos os venezuelanos pela via do diálogo, que reafirme os direitos humanos consagrados na Constituição, afastado do capitalismo selvagem e de ideologias marxistas e estadistas cujos resultados foram negativos nos países que as aplicaram."

Incomodada pelas declarações de alguns membros do Governo de que deveria excluir-se o ensino da religião católica das escolas públicas, a CEV pediu para não haver uma "politização ou ideologização da educação". A Igreja propõe que seja a família a controlar o tipo de educação que cada aluno recebe, cabendo ao Estado o papel de a orientar.

[Hoje:] Reforma do Ensino Superior no debate mensal do Governo na Assembleia da República

O primeiro-ministro, José Sócrates, escolheu a reforma do Ensino Superior para tema do último debate mensal deste ano, amanhã [hoje], na Assembleia da República.

José Sócrates considerou prioritária a reforma das Universidades e dos Institutos Politécnicos nacionais durante o seu discurso de encerramento do congresso do PS, em Outubro, em Santarém.

Este mês, em sede de comissão parlamentar, o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Mariano Gago, afastou a hipótese de a reforma planeada pelo Executivo prever o encerramento de Universidades públicas. No entanto, o membro do Governo adiantou que as instituições universitárias e do ensino politécnico serão alvo de uma "reestruturação".

Na Assembleia da República, Mariano Gago adiantou que o Governo está a negociar com entidades bancárias a criação de um sistema de empréstimos de baixos juros, tendo em vista ajudar estudantes.

Mariano Gago referiu que é intenção do Executivo arrancar com este sistema de empréstimos em 2007, tendo em vista ajudar os estudantes a pagarem as propinas e outras despesas relacionadas com a frequência dos respectivos cursos.

Por esse sistema, em vigor em vários países da União Europeia, os empréstimos contraídos apenas são pagos quando os alunos terminaram os seus cursos e quando começam a ter rendimentos.

O ministro Mariano Gago adiantou ainda que o número de licenciaturas do Ensino Superior público e privado adaptadas ao Processo de Bolonha vai duplicar no próximo ano lectivo, atingindo cerca de 90 por cento.

Se este objectivo se concretizar, em 2007/2008, 84 por cento das licenciaturas em Universidades e institutos Politécnicos públicos estarão adaptadas ao novo modelo de organização do Ensino Superior destinado a homogeneizar os graus e diplomas atribuídos em toda a Europa.

A estes 84 por cento, acresce ainda cerca de seis por cento de cursos de formação de professores, que funcionam com mestrado integrado e que também já estarão adaptados.

De acordo com o novo modelo de organização decorrente do Processo de Bolonha, acabam os bacharelatos e o Ensino Superior passa a estar assente em apenas três ciclos: licenciatura (com a duração de três ou quatro anos), mestrado (com a duração de um ou dois anos) e doutoramento (com a duração mínima de três anos).

terça-feira, dezembro 19, 2006

Colectivo «Choque Anti-Tecnológico» reivindica ataque incendiário com "cocktails molotov" ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior

Perante o silêncio dos meios de comunicação institucionais, reivindicamos [a nossa acção] nos meios [de informação] alternativos:

Na passada segunda-feira, dia 4 Dezembro, atacámos o edifício do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, sito na Rua das Laranjeiras em Lisboa, com 4 cocktails molotov.

Durante esses dias, decorreu a enésima conferência promovida pelo actual executivo com vista a tornar o teritório português no quintal europeu da devassa ecológica. Pela mão deste Ministério entram os mais diversos terroristas no nosso país: Biotecnologia e Nanotecnologia são sinónimos de Controlo-Social e destruição da natureza.

Fundação Gulbenkian, Caixa Geral de Depósitos e Universidade Nova de Lisboa são igualmente responsáveis por estes crimes.

Opomo-nos e oporemo-nos aos vossos planos. Que se multipliquem as acções.

Choque Anti-Tecnológico

100 docentes e 60 funcionári@s podem ser despedid@s da Universidade do Minho em 2007

Até Setembro de 2007, cem professores e 60 funcionárioS poderão ser despedidos da Universidade do Minho (UM), o que representa um corte de 20% nos quadros de pessoal da instituição. O anúncio terá sido feito pelo reitor Guimarães Rodrigues na última reunião da Assembleia. Ontem, o Departamento do Ensino Superior do Sindicato dos Professores do Norte (SPN) reagiu em comunicado, considerando a decisão "inaceitável".

De acordo com o SPN, as razões apresentadas pelo reitor para justificar esta medida terão sido o "decréscimo do número de alunos e as restrições orçamentais". No comunicado ontem divulgado, aquela estrutura sindical defende que, "infelizmente, o senhor reitor não facultou os números em que se baseou para afirmar que existe um excesso de docentes e funcionários na ordem dos 20%".

O motivo, refere o SPN, prende-se com o facto de "os dados que a própria UM [Universidade do Minho] envia para o Observatório da Ciência e Ensino Superior não sustentarem essa tese".

O «Diário de Notícias» procurou ouvir o reitor da Universidade do Minho sobre esta matéria, mas Guimarães Rodrigues não esteve disponível, por se encontrar numa reunião. Contudo, através do Gabinete de Comunicação, Informação e Imagem da Reitoria da Universidade, o reitor asseverou que não fez qualquer ameaça de despedimentos na Assembleia, tal como é referenciada pelo sindicato.

"Tal como sempre sucede, fez-se um balanço do ano que agora está a terminar e traçaram-se algumas expectativas para o futuro", explicou um elemento do gabinete. "Nesse contexto, falou-se das dificuldades que se poderão sentir no próximo ano", sem fazer ameaças de despedimentos, concluiu.

Para o SPN, "as medidas propostas, para além de injustificáveis, são também inaceitáveis". Aquela estrutura sindical afiança ainda que este tipo de "medidas tão extremas" não podem nem devem ser tomadas sem que antes se verifique uma "discussão e explicação fundamentada a toda a comunidade académica" e acusa mesmo a universidade de, com esta proposta, surgir "como um parceiro diligente e zeloso" do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, tutelado por Mariano Gago.

Segundo o SPN, a Universidade do Minho, que actualmente funciona com pólos nas cidades de Braga e de Guimarães, tem preenchidos cerca de metade dos seus lugares de quadros de professores (51%). Um valor que se situa ainda bastante da média das instituições de ensino superior a nível nacional, que ronda os 66%.

Para debater estas e outras questões, o sindicato anunciou que pretende convocar, logo no início do mês de Janeiro, uma reunião aberta a todos os docentes daquela Universidade.

segunda-feira, dezembro 18, 2006

3 X Miguel Vale de Almeida X 3

A 30.11.06: «"Se eu mandasse"...»

1) Metade das Universidades iam ao ar
2) Metade dos Politécnicos iam ao ar
3) Metade dos cursos iam ao ar
4) Transformava os Politécnicos em verdadeiros... Politécnicos
5) Acabava com cursos unidisciplinares no 1º ciclo
6) Proibia conversas sobre "empregabilidade"
7) Cada Universidade seleccionava os seus alunos
8) Profissionalizava a gestão das Universidades
9) Reduzia Bolonha a um sistema de equivalências europeias
10) Garantia concursos regulares e verdadeiramente independentes para lugares de docentes e investigadores e avaliações sérias destes

Enfim, sonhos despóticos...
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A 5.12.06: «Entre a espada mercantil e a parede burocrática»

Quanto mais uma pessoa entra na engrenagem universitária mais percebe que há dois modelos de referências e práticas em funcionamento hoje: o da empresa e o da repartição pública. Acontece que a Universidade não é - não deve ser - nenhuma destas coisas. Pode e deve ter uma gestão tão eficiente como a duma empresa, mas não tem nem deve ter os propósitos duma empresa; pode e deve ter o desígnio do serviço público, mas não é nem deve ser uma máquina de aplicação de normas burocráticas. O mais caricato - e o mais trágico - é que aqueles dois modelos coexistem, atropelam-se, contradizem-se e simplesmente impedem o desenvolvimento do ensino e da investigação - afinal de contas os desígnios da "coisa".
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A 13.12.2006: «Regresso à casa da partida (again)»

Já saiu o relatório da OCDE que vai servir de base para as mudanças no Ensino Superior (depois do ENQA). Por enquanto está disponível através dum link do «Público» (espero que acessível). Em breve, com certeza, na página da OCDE ou do MCTES. De qualquer modo, já é notícia.

(Ando nisto há vinte anos. Ainda não houve dois anos seguidos sem mudanças, reestruturações, renovações, revoluções, recomeços do zero, transições. Nunca nenhum modelo foi experimentado, vivido, testado pelo tempo. Com tantas análise, relatórios, recomendações, linhas de orientação, etc., já deveríamos ter um dos melhores sistemas de Ensino Superior do mundo. Not.)
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Miguel Vale de Almeida é doutorado em Antropologia, professor no ISCTE (Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa) e director da «Etnográfíca», revista de Antropologia da responsabilidade do Centro de Estudos de Antropologia Social (CEAS) do ISCTE.